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12 de fevereiro de 2017

Street Style: O fim da revista japonesa FRUiTS


"Não existem mais jovens estilosos para fotografar"
- Shoichi Aoki editor da revista FRUiTS


Fundada em 1997, a revista FRUiTS foi a mais influente publicação sobre Street Style japonês. Com foco no bairro de Harajuku, ajudou a levar fama mundial às subculturas que frequentavam o local, como as Gothic Lolitas, Gyarus, Decoras, Cyberpunks, o kawaii... e refletia um registro histórico confiável de toda uma geração que não seguia regras e nem rótulos ao vestir, comportamento tipico da geração X e dos primeiros millennials. O grande lance da FRUiTS era fotografar pessoas reais e autênticas, não modelos que estavam vendendo moda em páginas de revista.

ultima edição da revista FRUiTS
A última edição da FRUiTS

Shoichi Aoki começou a fotografar quando notou que os jovens japoneses estavam se vestindo de forma diferente ao invés de estarem seguindo tendências americanas e europeias. Estes jovens estavam customizando elementos da vestimenta tradicional japonesa (kimono, obi e sandálias geta) e combinando-os com  peças artesanais, de brechó e de moda alternativa, assim ele lança a publicação mensal FRUiTS, que se torna um fanzine cult com seguidores internacionais. Com o sucesso da publicação, jovens estilosos se direcionavam ao bairro para serem fotografados em referências estéticas que seriam imitadas no mundo todo. 



É impossível falar da moda dos últimos 20 anos sem citar a importância do Street Style. Até meados da década de 1990 quem ditava o que vestir eram as grandes grifes aliadas às modelos (Top Models) e revistas de moda. Quando a fotografia de Street Style aparece, todos os olhos da moda se viram às subculturas e aos jovens que não seguem tendências. A partir disso, os grandes estilistas passam a cooptar a moda de rua que vira um "boom" no mundo inteiro. Aoki relata que observou uma queda de "cool kids" que se encaixariam no padrão da revista e que isso se intensificou nos últimos anos. Mas quais os motivos disso acontecer?


O alternativo foi substituído pela gentrificação
De Gwen Stefani à embaixadora Kyary Pamyu Pamyu, o bairro de Harajuku se tornou um dos mais conhecidos do mundo nas últimas décadas, virando um local turístico saturado. Uma das características do consumidor japonês é a preferência por qualidade e não quantidade, a partir do momento em que ocorre a gentrificação de Harajuku devido ao investimento estrangeiro na região, os preços subiram e jovens designers alternativos não puderam mais manter suas lojas lá. Visando os turistas e seu poder de compra, houve no bairro uma inclusão de redes fast fashion como Uniqlo, H&M e Forever 21 (peças de baixa qualidade para o padrão japonês), assim os turistas preferem o status de comprar nelas (marcas conhecidas) do que nas lojas menores que tinham o espirito autêntico de Harajuku. Jovens também alegam que esse processo de estrangeirismo acabou com os espaços onde eles costumavam sentar e relaxar (e serem vistos e fotografados).


O Futuro do Street Style Japonês
Após 233 edições documentando subculturas e tribos de estilo em Harajuku, o fechamento da FRUiTS é mais um reflexo do que há anos falamos no blog: o esvaziamento de um conceito quando o capitalismo o abraça. A cooptação estética das subculturas pode parecer democrática, mas lá no fundo destrói as culturas alternativas independentes.
Esse caso também levanta o questionamento sobre o retorno do domínio europeu e americano na estética alternativa. Dos estilos Lolita ao Decora, passando pelas nail arts, a popularização dos cílios postiços e até a bolsa carregada no antebraço, tudo isso passou pelo universo alternativo de Harajuku, e hoje, quando pensamos em moda alternativa nos vem à mente que as maiores influências não são pessoas e sim marcas como Killstar, Dolls Kill e Iron Fist. Ao redor do mundo alternativos estão usando as mesmas marcas e as mesmas roupas que se massificaram, tornando as estéticas menos autênticas e individuais como no passado. Roupas massificadas contribuem para que estilos individuais entrem em decadência. Os jovens fotografados na FRUiTS não seguiam tendências, consumiam peças que tinham a ver com sua personalidade e praticavam DIY. Se analisarmos, mesmo no ocidente está se tornando mais difícil encontrar alternativos com estilos únicos.


Jovens coloridos como as cores das frutas. O fotógrafo Shoichi Aoki  pensa em doar seus arquivos fotográficos a institutos de moda ao redor do mundo.
 
A era FRUiTS chegou ao fim, a moda de rua no Japão agora vive nova fase.

Referências da pesquisa:
Spoon Tamago //  Tokyo Fashion Diaries // NYMag  // UNRTD // ID Vice



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13 comentários:

  1. Conheci a Moda de Rua Japonesa através desse tipo de publicação,ao mesmo tempo que fiquei feliz em saber como é ser alternativo na Suécia pelo outro post,me sinto triste em saber que esse tipo de publicação e estética está se diluindo.Odeio essa coisa de padronização nas coisas,mesmo que o estilo próprio de alguém seja minimalista o espirito de não seguir moda/regra torna esse individuo único.Notei que os bares alternativos entre 2010 até os dias de hoje, os frequentadores com estética extremamente alternativa sumiram desses locais,isso quando não há regra de vestimenta nos mesmos,ai que alternativo não vai mesmo...Gostava de sair não apenas para ouvir música,comer e beber,mas para ver pessoas diferenciadas e únicas,algo que a anos não vejo e não me lembro qual foi a última vez que vi.Nunca esqueço do dia que fui a uma festa a fantasia em um bar alternativo local sem fantasia, e a recepcionista perguntou se eu estava fantasiada pra incluir meu desconto na comanda.Me pergunto o que anda acontecendo desde então.

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    1. Eu acompanho a moda de rua japonesa há anos pois é algo que sempre me inspirou pela diferenciação, fico muito triste que isso esteja acontecendo em (Harajuku que sempre foi pra mim uma espécie de local onde ser diferente era o habitual.
      Eu vivo a mesma experiência que você Marcela, raramente vejo pessoas com estilo, sinto falta de ver gente criativa indo além do que está na moda. Parece que esse pessoal mora apenas "na internet" rsrs!

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  2. GENTE DO CÉU, ESTOU LEVEMENTE CHOCADA COM O "não existem mais jovens estilosos para fotografar". Choquei total! E realmente, a qualidade das peças tem decaído bastante. Quando fui na F21 daqui, esperando ver NOSSA MIL E UMA COISAS DIFERENTONAS, me decepcionei T O T A L. Compensa mais sermos felizes com nossos tecidos mesmo, viu? Concordo muito com que o editor da revista falou! Beijos Sana.

    4sphyxi4.blogspot.com.br

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    1. Ainda estou chocada e digerindo essa frase Jaque. :(
      Por mais que a gente saiba que estilos autênticos e não massificados são difíceis de encontrar, ouvir isso de um editor de uma revista desse porte parte o coração.

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    2. Concordo com a questão dos tecidos! Temos tecidos ótimos aqui no Br que custam poucos reais o metro e dá pra criar uma peça como a gente quiser.

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  3. Em pensar que ia até o bairro da Liberdade folhear a FRUiTS por não ter dinheiro para compra-las na época da faculdade e ficava por horas olhando tudo aquilo. Adorava saber que em algum haviam pessoas se vestindo da maneira que bem entendessem e que este movimento ia muito além de não consumir grandes marcas. Tinha um lance de estilo e político também. Mas moda é isso aí, sempre se reformula e se hoje muitos querem grandes marcas amanhã voltará à ser a vez dos pequenos novamente. Tudo na moda segue um movimento louco que nenhuma gigantes pode controlar por muito tempo. :)
    Adoro seus artigos! ♥

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    1. Fui uma grande admiradora da revista também Jenifer, quantas vezes aqueles visuais me inspiraram em coleções, em criar meu próprio estilo... FRUiTS vai fazer falta, espero que logo surja um novo local, novos jovens... vamos torcer ;)

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  4. Bela matéria,como sempre!É lamentável ver o mainstream se apropriar de todo um estilo,toda uma identidade singular em prol do lucro.Na verdade é o que vemos há um tempão com todos os estilos alternativos,essa febre rocker no Brasil por exemplo que parece não passar mais!Todo esse modismo gera jovens vazios,sem identidade e propósitos,interessados apenas no visual pra chamar a atenção,ou porque acharam legal,apenas consumidores dos ditos "fast fashion".Cadê aqueles jovens subversivos e iconoclastas,não só na indumentária,mas também no agir,na filosofia de vida?Adeptos do faça você mesmo?Que customizavam suas peças com personalidade?Lembrei de outra matéria Sana daqui do MDS,no qual Joe Corré queima relíquias punks de família,entendo essa revolta dele,e compartilho da mesma,não só com o punk,mas toda a cultura alternativa,mas existe um esperança aí,a prova é justamente esse ato dele de manisfesto genuinamente punk!Extrapolei um pouco aqui galera,mas o tema realmente rende muito debate e reflexão.....

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    1. Muito obrigada Sara, adoro ver você por aqui. No sistema atual tudo "tem que" virar lucro e assim perdemos essa grande riqueza que é a individualidade estética das pessoas. Joe Corré passou uma ótima mensagem, levantou um questionamento, como você disse, há uma falta de jovens iconoclastas, de atitude, é algo difícil de superar, essa ausência.
      Imagina, amei o comentário <3

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  5. Ultimamente vejo muitos blogs falando da "decadência" de Harajuku, estou realmente triste já que acompanho desde minha infância. Fiquei chocada em saber que estilos como Lolita estão mais fortes na Europa e América

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  6. Toda vez que eu leio algum artigo sobre a decadência de Harajuku eu deprimo, ngl. O pior é que são vários fatores juntos? A massificação do que antes era alternativo; a gentrificação de um distrito a favor de turistas (sendo que turistas vinham mesmo era conhecer o fator punk subcultural), acelerada com o processo de modernização pras Olimpíadas de 2020; os anos e mais anos de um governo de direita conservadora aliados a uma sociedade que ainda reluta em ver a individualidade com bons olhos, ainda mais quando se entra na idade de procurar um emprego...

    Tbh eu não vejo o alternativo do Japão sumindo, mas completamente enxergo Harajuku perdendo essa identidade -- igual o que aconteceu com a subcultura gyaru em Shibuya.

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    1. Adorei suas análises.
      É verdade, o alternativo não desapareceu do Japão mas se espalhou, esse espalhamento agora dificulta o trabalho dos fotógrafos de street style e quem ia lá atrás de inspiração.

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