Destaques

10 de novembro de 2017

Como é ser gótico e alternativo em Portugal?

A leitora portuguesa Oriana Bats do blog "Bats on the East Tower" nos enviou esse relato sobre como é ser gótico ou alternativo em Portugal. Se você é nosso leitor e mora no exterior, fica o convite para nos mandar suas observações sobre a cena alternativa no país em que reside, basta enviar o texto para este e-mail. Confira também a postagem escrita pela colaboradora Cha Trinsi sobre Como é ser alternativo na Suécia.


Festival Entremuralhas - Fonte

A existência de diferentes culturas é um fenómeno mundial. Nascem e crescem. Espalham-se e alteram-se (não necessariamente por essa ordem). Mas existem, regra geral, em todo o lado. O meu país, Portugal, não é excepção.
Portugal é um país de dicotomias: tanto existem as chamadas “cidades grandes”, como terreolas no meio de nenhures onde, depois do fenómeno da TDT (Televisão Digital Terrestre), há quem não consiga ver o Telejornal. 

Sinto que o mesmo se passa com as culturas consideradas mais alternativas/diferenciadas: nuns lados são bem aceites. Noutros, bem… são menos. Foi graças a essas dicotomias que resolvi pedir ajuda a alguns amigos para escrever este post. Pensei que, dar apenas a minha opinião (sendo eu uma pessoa que vive numa zona mais rural) seria pouco para abordar o tema. Falemos então primeiro das minhas vivências, antes de passarmos às dos meus amigos. 

A localidade onde vivo, apesar de apenas distar 50km da capital, já é considerada zona rural. A zona tem imensos cafés, cabeleireiros e alguns locais abertos à noite onde se pode ouvir música e beber algum copito. No entanto, esses locais apelam mais para música considerada “mainstream”, o que por aqui significa kizomba e grupos/cantores mais conhecidos. 

Apesar de, na maior parte do tempo, não ter quaisquer problemas, também por aqui podemos ver algumas reacções bem engraçadas. Lembro-me, por exemplo, de uma senhora que foi contra uma placa de um café (e a deitou ao chão), porque não fez outra coisa que não olhar para mim. No entanto, nem tudo são coisas divertidas. Uma vez fui seguida por 2 homens que distribuíam panfletos religiosos (sobre a família, e como só uma boa relação com Deus levaria a que a pessoa fosse feliz, etc). Enquanto vinham atrás de mim, diziam que tinha de deixar o Diabo, que Deus me ia perdoar… aparentemente cabelo azul e roupa preta dá em coisas destas.

Tal como já mencionei, pedi ajuda a alguns amigos de diferentes partes do país para compor este post. Recebi então alguns relatos, desde estereotipização, dificuldades em arranjar emprego/conseguir expressar-se (em termos visuais) um pouco mais no emprego onde está, passando por “purificações com água benta” e recordações constantes acerca da época do ano em que nos encontramos (o típico “Ainda não é Halloween/Carnaval” ou “O Halloween/Carnaval já passou”). Isto tudo entre outras situações.

No entanto, nem tudo são coisas más. Em 2010, surge o festival Entremuralhas. Com o lema “Há uma cultura que não se vende nas prateleiras do hipermercado”, o festival foi-se desenvolvendo em torno da música menos comercial (alguns dos nomes que já passaram por cá: Clan of Xymox, VNV Nation, Vive La Fête, Har Belex, Aesthetic Perfection, She Past Away e Parzival). A atenção dada por parte dos media a este evento (assim como o aparecimento de algumas reportagens mais sérias) contribuiu para esclarecer alguns mitos. No entanto, este não é o único festival dedicado a música mais diferenciada que existe em Portugal, sendo que outros bastante conhecidos são o SWR Barroselas, o Vagos Open Air e o Amplifest, entre outros. Temos também eventos mais pequenos como o Halloween Metal Fest, que se realizará pela primeira vez este ano. Existem ainda alguns eventos relacionados a modificação corporal, que também costumam ter algum destaque nos media. Todos, à sua maneira, contribuem para uma diferente visão das culturas alternativas/diferenciadas em território português.

Godvlad no Vagos Metal Fest - Fonte

Portugal tem ainda muito que mudar, começando pelos membros de culturas alternativas/diferenciadas em si. Aqui ainda existe muito quem diga que há pessoas que se “põem a jeito”*. Lembro-me de ver num fórum relacionado a música vários posts (já algo antigos) que criticavam outras culturas alternativas, por exemplo. Isto para além de comentários sobre as pessoas que se “punham a jeito”* (no sentido de receber comentários negativos ou preconceituosos) porque chamavam muito a atenção (seja por atitudes, roupas, etc) e depois queixavam-se, na opinião dos comentadores, sem qualquer razão. Sinceramente não vejo muita gente vestida “over the top” em Portugal, a não ser para eventos e acontecimentos do género. Mas, como passo pouco tempo em cidades, essa observação pode ser tendenciosa. No entanto, como tentar que haja mudança, se os próprios têm semelhantes pensamentos? 

Tenho plena consciência de que as coisas já estiveram piores. Basta ver uma reportagem, penso que dos anos 90, sobre Black Metal que começa assim: “A música de Satanás, uma década depois, os seguidores do Black Metal, anticristãos e satanistas, aumentaram consideravelmente nos últimos anos. Profanar cemitérios e incendiar igrejas são rituais satânicos cumpridos por muitos dos que fazem do Black Metal uma forma de estar na vida.”. Ou mesmo algum artigo sobre um crime que ocorreu em Ílhavo em 1999, que foi definido como tendo conotações satânicas, pois o autor tinha uma banda de Heavy-Metal e vestia-se a rigor. Claro que as coisas já estiveram piores e, nalguns lados, pouco mudaram. Como faço muita pesquisa relacionada ao tema, é fácil ter essa noção. No entanto ainda há muita coisa que precisa de ser alterada. Tanto no meu país como no resto do mundo.



Acompanhe nossas mídias sociais: 


Artigo de Oriana Bats em colaboração com o blog Moda de Subculturas. É proibida a reprodução total ou parcial do conteúdo aqui presente sem autorização prévia do autor. É permitido citar o texto e linkar a postagem. É proibido a cópia da ideia, contexto e formato de artigo. Plágios serão notificados a serem retirados do ar (lei nº 9.610). As fotos pertencem à seus respectivos donos, porém, a seleção e as montagens das mesmas foram feitas por nós baseadas na ideia e contexto dos textos.

Comentários via Facebook

1 comentários:

  1. Adorei o artigo e a série em si, sobre alternativos ao redor do mundo. Me mudei pra Portugal há 5 meses e vim muito curiosa (e com um pouco de medo, pra ser sincera) pra saber como seria a cena aqui, se teria lugares pra frequentar (eu estava com a cabeça bem fechada, achando que por ser um país bem tradicional, pequeno, eu não me encontraria) se eu me adaptaria bem, se seria bem aceita por ser brasileira e coisas do tipo e quando cheguei levei um tapa na cara bem dado por mim mesma. Eu estou vivendo uma experiência incrível, a cena é muito mais ativa aqui do que na zona em que eu morava no Brasil. (eu sofria bastante no Brasil, porque não tinha um rolê sequer de Hard e Glam, que sempre foram meus estilos favoritos, a não ser na capital SP, que era bem longe). Tem como eles dizem, discotecas de Metal, que tocam de tudo, tem noites de Folk/Viking, Gothic, Hard/Heavy, tem até uma que só toca as baladas 80´s, AOR. Sem falar nos festivais incríveis com line-ups recheados com muita qualidade e os preços então... Ano que vem, verei o Judas e o Ozzy, concerto que paguei 65 euros (o que no Brasil, não sairia menos de 500 reais para mim, por morar longe pra caramba das capitais). Enfim, falei esse tanto mas pra mostrar o quanto me enganei sobre a ideia que tinha de Portugal e que a cena é bem ativa, acessível a qualquer género e tem bandas insanas que passam por aqui, bandas que no Brasil eu nunca teria a oportunidade de ver (Europa «3)
    E quanto ao preconceito, como a Oriana disse, tem zonas diferentes por aqui, eu vivo em uma bem perto de Lisboa, então as pessoas são mais "na boa" e a maioria pra ser sincera, são turistas pra lá e pra cá mas me impressionei com esse fator, nunca sofri nenhum preconceito ou comentário pela minha aparência(não tenho um visual tão carregado mas tenho colegas que sim e nunca se queixaram) tenho cabelo azul ( pra falar a verdade, a quantidade de senhorinhas mais velha que já vi aqui com cabelo colorido, me surpreendeu haha), piercing e tatuagens, e consegui emprego, tenho vários colegas mais velhos que passam por aqui pra conversar e são extremamente simpáticos. (Já fui maltratada em um restaurante que trabalhei mas simplesmente por ser brasileira). Enfim, no geral, aqueles olhares são inevitáveis mas isso com certeza é no mundo todo, na minha cidade no Brasil a quantidade de vezes que que ouvi: "bruxa", "Rita Lee", "satânica" se tornaram banais e sempre acabava levando na boa e agradecendo. No resumão, pra mim a cena de Portugal está dando de 10-0 na do Brasil, sem contar também com a quantidade de tretas, picuinhas, problemas, falsidade que existe por ai, pelo menos na cena de São Paulo... Falo isso tudo com base na Zona de Lisboa e os lugares que já conheci. E novamente, adorei os artigos.

    ResponderExcluir

Obrigada por comentar! As respostas serão dadas aqui mesmo, então não esquece de clicar no botão "notifique-me" pra ser informada.

© .Moda de Subculturas - Moda e Cultura Alternativa. – Tema desenvolvido com por Iunique - Temas.in