Vamos pensar em subculturas no seu conceito tradicional.
Fazer parte de uma subcultura é ser parte de um grupo que compartilha as mesmas ideias, sendo assim existem regras estéticas (com significados simbólicos) de identificação a serem seguidas.
Quando pensamos em subculturas como a punk, a gótica e a rock/metal, lembramos de suas origens de jovens rebeldes, contestadores, questionadores, avessos às regras impostas pela sociedade e em alguns casos, com atitudes anti-capitalistas. As roupas entravam como expressão da criatividade, uma novidade estética proposta por estes grupos que não necessariamente visavam serem “aceitos”, mas mostrarem diferença de ideias através do vestuário.
Em subculturas como a punk, gótica e metal, por exemplo, o senso de grupo é extremamente importante, o que significa que pra você fazer parte delas, além de curtir o som, dever se vestir "igual". Este "se vestir igual" é necessário porque roupa é a linguagem que estes grupos empregam para se comunicar uns com os outros indicando interesses comuns ou envolvimento com atividades semelhantes.
Se vestir igual, significa concordância de ideias e gosto por atividade semelhantes.
A subcultura surgiu na classe trabalhadora, por isso esse tipo de roupa é usada.
O cabelo longo é herança hippie e os acessórios referência punk. Mesmo com roupas "iguais", estudos sociológicos dizem que os headbangers são e adoram serem únicos!
Ser parte de uma subcultura não era simplesmente ficar com o lado divertido da vida. Era ter uma atitude heróica contra a cultura de massa. Tanto que muitos nunca tiveram empregos normais e nem vida dupla de "usar roupa careta pra trabalhar", muitos se mantiveram no underground trabalhando em lojas de roupas, discos ou na cena noturna. Mas com o passar das décadas isso deu uma mudada. As gerações mudaram. O mundo mudou. A internet chegou. O capitalismo nos abraçou. À medida que os costumes da sociedade e as gerações foram mudando, muitos punks, góticos e headbangers se adaptaram ao mercado de trabalho e amenizaram seus estilos porque tornou-se necessário ter uma participação maior dentro do sistema (o corporate goth é um reflexo dessa mudança de comportamento).
Atualmente, os jovens têm laços cada vez mais frágeis com as subculturas, as ideologias foram substituídas por estéticas vazias de significado - muitos não se interessam em saber o simbolismo da peça de roupa que estão usando. Hoje em dia é praticamente impossível criar qualquer subcultura que se coloque em oposição ao mainstream porque o mainstream se apropria dela em pouco tempo. Isso é um processo comercial e econômico. Significa que o capitalismo chegou ao ponto extremo de tornar subculturas como parte do mainstream, pelo curioso fato de que elas deixaram de fazer resistência aos valores da cultura dominante.
Se você é uma pessoa que não resiste aos valores da cultura mainstream e até os aprecia, como você pode se identificar com alguma subcultura específica?
Você não se identificará.
Por que as subculturas aparentemente deixaram de
fazer resistência ao mainstream?
Subculturas são formadas por pessoas. As gerações mudaram, estas pessoas não querem mais ser parte de um grupo, querem ser individualistas. O mainstream te abraçou com uma sociedade em que absolutamente tudo é fabricável, desejável e comprável e você aprecia e quer fazer parte dessa vida de consumo, não quer resistir à ela ou criticá-la. Numa era de selfies e likes, uma vida em grupo, gostos e atividades em comum, parece ser desinteressante para as pessoas.
É cada vez menor o interesse dos jovens de serem parte de um grupo subcultural. Estudos dizem que se este comportamento permanecer, em poucas gerações as subculturas em seu conceito tradicional estarão extintas. Será que conseguiremos reverter suas extinções?
A Era da Individualidade
É comum ouvir da geração que é adolescente/jovem no século XXI que eles não se encaixam em nenhuma subcultura e dizem pertencer ao universo alternativo como um todo. Ao invés da identidade de grupo há a identidade fragmentada; ninguém quer ser rotulado, o comprometimento e os laços com a subcultura são fracos, o que faz os jovens “trocarem” de subcultura quando bem quiserem; passeiam entre várias delas; ao invés de pertencerem à uma subcultura por seus valores e crenças, faz-se parte delas pelo fascínio das roupas e da imagem; a auto imagem autêntica virou um não autêntico diverso.
Essa é uma característica dos chamados jovens da geração Y ou Millennials. São jovens nascidos a partir do ano de 1979 até metade da década de 1990. Os jovens da geração anterior, a X, ainda preservavam o conceito tradicional de subculturas. Por isso, é possível ver pessoas na faixa dos 40 anos ainda fiéis à subcultura gótica ou headbanger, por exemplo.
A modelo Lady Amaranth é gótica. Ela é do tipo de pessoa que se identificou com uma subcultura e permaneceu somente nela a vida toda, sem mudar pra outra.
Algo raro entre a geração Y.
Em contraste com Lady Amaranth, jovens da geração Y se declaram individualistas e sem interesse em pertencer à uma subcultura específica e sim, ao universo alternativo como um todo. Essa identidade fragmentada se reflete nas roupas. Uma mistura de tendências moda mainstream contemporânea com moda alternativa. A garota da foto abaixo gera uma análise interessante, suas referências estéticas são as mais diversas. As roupas podem ser de lojas mainstream. Notamos referências das subculturas: Heavy Metal, Hard Rock, Pastel Goth/Creepy Cute (meias, cruzes) e cultura pop. Outro aspecto interessante é o padrão de beleza mainstream (magra, alta, loira, traços delicados).
"Sou individualista. Não quero me ligar à nenhuma subcultura pois não me interessa seguir as regras estéticas.
Quero entrar no terreno delas com roupas muito diferentes das que elas propõem."
E quando uma pessoa quer frequentar a cena metal, mas não quer usar tacha e blusa/preta de banda? Ou quer frequentar a cena gótica mas não quer usar preto, por exemplo?
Subculturas têm suas regras estéticas que precisam ser respeitadas. Se você vai num local que é o espaço de uma subcultura, mesmo que você não seja daquela subcultura, precisa respeitar. Roupas são símbolos, é forma de linguagem, o não uso desses símbolos te leva ao julgamento como intruso, uma pessoa que não pertence àquele ambiente e nem foi convidada como exceção.
As subculturas são antes de tudo um grupo com interesses em comum. Uma roupa errada pode simbolizar discordância de ideias com aquelas pessoas. É preciso que exista um respeito ao dresscode.
Parta sempre do princípio da diplomacia: se quer ir num bar/show de metal, mas não quer usar couro e spike, respeite a subcultura, o espaço dela e use elementos neutros que não agridam aquelas pessoas (um jeans e um camiseta podem funcionar na cena metal e um vestido liso pode funcionar na cena goth!) ou simplesmente... não vá. Às vezes é preciso ter sensatez.
"Insisto! Não quero respeitar o espaço da subcultura, quero ir no show de Metal usando um vestido florido azul com rosa e verde e um sapato prateado!
Acho que eles é que estão errados em me julgar."
É seu direito se vestir como quiser. Mas o traje que você usa sempre vai passar uma mensagem no ambiente que você entrar. Se você toma a decisão de ir no terreno de um grupo mostrando que não concorda com as regras estéticas deles, também deve que estar apto e aberto pra aceitar que poderá ser considerado um intruso e até mesmo ser hostilizado. Lembre-se que subculturas são feitas de pessoas com ideias opostas ou paralelas ao considerado padrão e que cada um dos elementos que usam tem uma simbologia/significado.
Subculturas são fontes riquíssimas em
matéria de estudos sociológicos, antropológicos e de moda. A moda além
de usada como auto expressão reflete um descontentamento com os padrões
sociais vigentes através da simbologia de suas roupas. Ainda hoje no Brasil, existe a necessidade de falar mais sobre subculturas para desmistificar muitas coisas e, ao mesmo tempo suprir a falta de informação sobre elas.
* Postado originalmente
em agosto de 2014, em meu blog pessoal, importado e com texto atualizado para o MdS.