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24 de março de 2013

As Mulheres no Heavy Metal – Parte 3 (Década de 2000)

A década de 2000 começou com duas tendências fortes no Heavy Metal: uma linha revivalista dos sons dos anos 1980 (Hard e Metal Tradicional) e bandas com vocalistas femininas de vozes semi-operísticas que ganharam espaço nas páginas de revistas especializadas. O interesse do público por estas bandas também sinalizou um novo mercado para as gravadoras que correram atrás de bandas "female fronted", onde mesmo não sendo as principais compositoras, elas eram o chamariz ocupando a parte central das fotos. São bandas de destaque nesta época:  Nightwish, After forever, Within Temptation, Edenbridge, Sirenia, Tristania, The Gathering, Lacuna Coil e poucos anos depois Epica, Delain, Sirenia e Leaves’ Eyes.

Cantoras como Tarja e Sharon provocaram uma forte mudança na cena HM: uma invasão feminina. Meninas se identificavam com as vocalistas e passaram a frequentar a cena.



Divas
A popularidade destas vocalistas provocou uma mudança na cena HM: uma invasão feminina. De repente, centenas de garotas em corsets, saias e cabelos longos, rendas, maquiagem e feminilidade invadiram shows atraídas pela identificação com aquelas mulheres. Então, um termo invade o Heavy Metal: “divas”.
Até fins dos anos 1990, as mulheres do HM tinhas praticamente duas estéticas e comportamentos: uma mais agressiva e contestadora e outra mais sexy e extrovertida. Normalmente se optava por uma delas. 
Já as garotas fãs das "divas", tinham uma estética e comportamento mais próximos da cena gótica, eram misteriosas, distantes, femininas e praticamente com nenhum interesse em contestação ou rebeldia, eram mulheres bem mais passivas. Um oposto do que é considerado "atitude" no Rock/Metal, e o contrário do que o movimento Riot Grrrl tinha acabado de promover para as mulheres desde meados da década de 1990.

Mas no lado mais extremo, pouco midiatizado, a essência do movimento Riot e das mulheres com atitude ainda resistia. Especialmente no Black Metal em bandas como Astarte, Ludicra, Cadaveria, Kriegtalith, Bestial Holocaust, Thorr's Hammer, Darkspace, Darkened Nocturn Slaughtercult e  Gallhammer. Já Théatres des Vampires (Black/Gothic) e Genitorturers (Industrianl) tem estéticas mais fetichistas de mulheres dominadoras.



O Folk, o Celtic e o Pagan Metal também se desenvolviam em paralelo. Uma das que se destaca nessa cena é Macha do Arkona cujo tema e estética focam no folclore russo, mitologia eslava e e medievalismo.



Em 2001, Arch Enemy troca seu vocalista homem por uma mulher: Angela Gossow. A repercussão na mídia foi imensa. Mas porquê, se já houveram outras mulheres que cantavam gutural antes de Angela? Os motivos podem ser dois: uma mulher substituía um homem (mostrando a superioridade feminina numa cena machista) e o outro motivo é que Angela é uma mulher bonita. O fato é que esse interesse da mídia por ela, fez com que gravadoras se interessassem por bandas extremas com vocalistas mulheres.  



Na linha mais tradicional, Doro volta a se destacar a partir de 2002, mas é em 2006 que ela toma os holofortes novamente devido à onda revivalista do som dos anos 80 iniciada principalmente através do site MySpace. Outras bandas de Trad Metal, desta época são: White Skull, Crystal Viper, Ignitor, Wilde Star, Chastain, Vainglory, Benedictum e Sister Sin. Holy Moses também volta a ter o merecido reconhecimento. E mais pro fim da década Lita Ford também retorna.

No metal tradicional: Marta do Crystal viper, London Wilde, Kate French do Vainglory, Liv do Sister Sin:


O retorno das deusas oitentistas como Doro, Sabina e Lita Ford:


Devido ao revival do Hard/Glam Metal através da cena Sleaze sueca, bandas femininas focada no estilo surgiram: Jaded, McQueen, Hysterica e Crucified Barbara que é a que teve mais destaque.  

Crucified Barbara

Nunca  houve tantas mulheres no HM como na década de 2000 e isso foi notado pelos criadores do festival belga Metal Female Voices que acontece desde 2003. Acompanhando a moda do momento, as primeiras edições tinham muitas bandas gothic e symphonic  com as mesmas bandas se repetindo com os anos. Foi só a partir de 2007 que bandas como Battlelore, Doro e Holy Moses foram incluídas. E em 2008 quando o revivial oitentista teve seu auge, bandas como Girlchool, Benedictum, Izegrim, White Skull e Eths foram convidadas a participar.


 
À medida que a década avança bandas de Death, Black e Melodic Thrash Metal com vocalistas mulheres aumentam. 


Metallic Kitty, Marloes Izegrim, Nina Saile e Candice: as meninas do Death/Thrash Melódico.




Voz Natural Feminina ou voz "Pop"?
Os vocalistas de heavy metal são valorizados por seu poder de alcance dos agudos, é um ato de superação atingir tais escalas, já que a voz masculina não é naturalmente aguda. As mulheres no HM são valorizadas se tiverem voz de média a grave remetendo à tons semelhantes aos dos homens, assim, o impacto de ser mulher na cena se torna menor. Coloque uma mulher com voz de mulher em uma banda de Heavy Metal e aguarde o seguinte comentário: “a voz dela é pop”.

Existe insulto maior dentro do Heavy Metal do que ser comparada com midiáticos artistas pop? Não. 
Quando as bandas de vocais femininos semi-operísticos surgiram, estas mulheres tinham voz feminina sim, mas eram vocais etéreos, distantes e contrapondo com vocais agressivos masculinos, normalmente os caras eram os “donos” das bandas, demonstrando que a mulher podia ter a voz feminina, mas não sem um homem por trás para apoiá-la.
Quando Nightwish trocou sua vocalista Tarja Turunen por uma vocalista que usa a voz natural, Anette Olzon, gerou grande polêmica sobre a “inferioridade” dos vocais de Anette e um dos insultos mais usados era que a moça tinha “a tal” voz pop. É em situações como esta que a gente percebe como a cena HM é preconceituosa e machista. Se encaixarmos o “voz pop” como sinônimo de voz natural feminina, toma-se como insulto uma mulher demonstrar a naturalidade de sua voz feminina ao cantar no Heavy Metal.

Um exemplo de banda Black/Doom onde a vocalista Lexi usa sua voz natural é Devlin, projeto paralelo de Marcus Ehlin do Siebenburger.





E o que dizer da incrível Agnete Kjolsrud do Djerv? Sua voz soa como uma Gwen Stefani from hell. É uma voz diferente e ela prova que a voz feminina precisa ter espaço sim no HM!






A regra diz que Metal precisa ser agressivo. E é nestas que entram as maiores desculpas do gênero para que a mulher vocalista de metal tenha que ter uma voz agressiva. 
Ou isso será apenas uma idéia machista e conservadora? 
Com mais mulheres na cena HM, mais variedades de vocais vão surgir e é preciso ter mente aberta. Muitos se prendem aos primórdios e não aceitam que o Heavy Metal evolua e se diversifique (a história do "falso metal"). É tão bom de vez em quando escutar bandas em que as vozes das garotas fogem do "padrão". Hoje em dia, mulher cantar gutural no metal é até normal. Audaciosas são as que assumem usar suas vozes femininas e naturais com muita atitude.

Agnete do Djerv que tem voz super feminina: O que importa é ter atitude!

Metal Alternativo no Mainstream:
O Alternative Metal foi o que mais teve destaque nesta década, seguindo uma linha moderna e com experimentações, atingiu páginas de revistas especializadas especialmente nos EUA. Bandas com vocalistas que se destacam são In This Moment, Halestorm, The Agonist, Flyleaf, Otep, My Ruin e Walls of Jericho. Baixistas como Karin Axelsson da banda sueca Sonic Syndicate, Doris Yeh da banda Taiwanesa Chthonic e Jeanne Sagan da All That Remains. Tecladistas como Marta da Bleeding Through e Kristen Randall do Winds of Plague. Guitarristas podemos citar  Laura Christine do Warface, Leah Woodward do Aliases, Laura Pleasants do Kylesa, The Commander-In-Chief,  Orianthi e bateristas porque não citar as brasileiras Fernanda Terra e Jully Lee?

As vocalistas Candance (Walls of Jericho), Shamaya (OTEP), Alissa (The Agonist) e Tairrie B (My Ruin); a baixista Karin (Sonic Syndicate) e a tecladista Marta (Bleeding Through). E por fim a guitarrista Laura (Warface) e a rainha do shred Comander - in - Chief, que escolheu esse nome artístico porque queria um nome que mostrasse que é ela quem manda.



Mas sempre há a necessidade de "provar" serem boas no que fazem ou ouvir palavras do tipo "ela é razoável". 
Shamaya Otep, passou por um momento machista no Ozzfest de 2001: enquanto tocava, ouviu gritos de um homem que dizia insistentemente, “mostre seus peitos!" Ela ignorou algumas vezes mas num dado momento, Otep parou o show e desafiou-o a mostrar suas partes de baixo publicamente. O homem sumiu na multidão. Shamaya diz que, assim como muitos homens, ama música agressiva e não há nada mais agressivo do que o metal, daí sua paixão pelo estilo. As mulheres também sentem raiva e decepções e tem o direito de se expressarem!

Angela Gossow conta que quando ela foi divulgada como a nova vocalista da banda Arch Enemy: "No início parecia haver alguns machos não entusiasmados com a ideia de uma mulher cantando na banda. Talvez eu estivesse ameaçando a seus próprios egos inseguros. Alguns caras dizem que tem que “ter bolas” pra cantar gutural. Bem, eu tenho bolas maiores do que eles têm. Elas só são penduradas um pouco mais acima e são chamados de seios". "Eu sabia que um dia eu encontraria um homem ou dois e que  poderiamos virar parceiros musicais."

Marta Peterson da Bleeding Through, conta que certa vez ela  usava uma mini saia no palco quando notou um rapaz tentando tirar fotos por debaixo. Deste então, contra a vontade, ela alongou a barra de suas saias de palco. "Eu definitivamente ouvi coisas obscenas em minha vida. Eu só acho que é desrespeitoso. Você vai ver alguém tocar, eu não sou uma stripper, não é como se eu estive lá pra ser julgada por minhas roupas. Simplesmente não há razão para isso. Se você está lá porque gosta da nossa banda, apenas mostre algum respeito." Ela ainda lembra de algumas experiencias humilhantes na estrada, discriminação de seguranças ou produtores que achavam que ela era amiga da banda ou groupie.

Separei um vídeo do Ozzfest em que Cristina Scabia, Candance e Marta contam como é ser uma garota em turnê.




As mulheres do HM, sempre tiveram algum tipo de proposta sobre seus visuais em algum momento de suas carreiras, pode ser posar mais sexy para fotos, mudar os cabelos... vai de cada um decidir sobre o rumo que prefere na carreira. Lzzy Hale do Halestorm foi questionada pela gravadora se ela comporia mais letras "sexies" e assim ela o fez neste último cd da banda. Doro Pesch perdeu contrato com uma grande  gravadora nos anos 90 porque se negou a escurecer seus cabelos, já que cabelos escuros dão um ar mais "rebelde". Suspeita-se que Simone Simons do Epica seja proibida pela gravadora de tirar o ruivo (sexy) ou fazer qualquer modificação em seus cabelos.


As Garotas mais quentes do Metal
Na cena HM, as mulheres sempre são lembradas por serem...mulheres.  O aumento de garotas em bandas de metal, gerou em meados da década de 2000 idéias como a da revista Revolver, o "Hottest Chicks in Metal/Hard Rock", algo como uma lista das mulheres mais “gostosas” do rock/metal. Nestas edições anuais, algumas mulheres músicas posam em fotos sensuais para as páginas da revista e calendários. O editor chefe da revista Tom Beaujour, confessa que estava mais interessado em publicar imagens encorajadoras para os homens. 
As edições anuais do Hottest Chicks in Metal/Hard Rock são sempre a segunda mais vendida do ano. "Nós decidimos colocar as mulheres na capa não porque estamos tentando promover as mulheres na música", disse Beaujour, "É porque vende melhor." Ele ainda diz  que “Cada edição da Revolver é basicamente um 'Homens mais sexy Metal' porque você tem 125 páginas com homens." Engraçadinho ele... só esqueceu de dizer que estes homens estão em fotos promocionais, em poses tradicionais e totalmente vestidos...

Capas das edições da "Hottest Chicks in Metal/Hard Rock"


Women in Metal – Queens of Noise
Em 2006, na mesma semana em que Revolver lançou sua edição do Hottest Chicks, a revista concorrente Metal Edge publicou sua versão: "Women Who Rock". A matéria mostravam mulheres variando de Lita Ford,  Sean Yseult  a Cristina Scabbia que falaram sobre suas vidas e a música que eles fazem.  Ao invés de colocá-las na capa, os editores da Metal Edge colocaram a banda P.O.D. Foi uma abordagem mais tradicional, mas é curioso notar que o editor-chefe da revista e o editor assistente, são na verdade, mulheres. Uma das editoras diz: “É difícil de remover as mulheres de sua sexualidade, mas acho elas são muito vistas e apreciadas como sex symbols,  mas nós não as vemos apenas um rosto e um corpo e sim, como músicas.

Em 2012, a revista Decibel também quis contrariar a Revolver e lançou paralelamente uma edição chamada “Women in Metal – Queens of Noise” e na capa, mulheres em poses poderosas que usam o fato de serem minoria como uma forma de expressar poder.


Ninguém tipifica mais o "mulheres mais quentes do metal" do que um Cristina Scabbia. Cristina tem uma beleza quente, morena e sexy. Ela parece não se importar de ter sua imagem associada ao lado sensual: "A coisa mais importante é dar um ponto de vista diferente da sensualidade, o fato de que existem tantas meninas bonitas ao redor que não acreditam em si mesmas e pensam que para ser bonita é preciso ser uma Playmate com peitos falsos ou algo assim...". Cristina tem uma coluna na própria revista Revolver onde responde perguntas dos leitores sobre relacionamentos amorosos.

Cristina Scabbia tipifica bem a idéia de mulher mais sexy do metal: olhos fixos na lente e mãos simulando abrir a blusa/decote.



Angela Gossow também participou de uma das primeiras edições do "Hottest Chicks”, mas nos anos seguintes, decidiu que queria ser julgada pelo seu talento e não por sua imagem e se  recusou a ser fotografada novamente para um outra edição. Mesmo assim, revista publicou uma antiga foto dela,  Angela ficou furiosa e a briga com o editor da Revolver se tornou pública: “Eu já expliquei várias vezes que eu não quero ser caracterizada assim. Se eles querem uma foto da banda pra falar sobre nossa música, tudo bem, sem problemas. Mas se é sobre eu ser uma mulher... Eu não gosto das Hottest Chicks no movimento do metal. Eu acho que é muito contraproducente e um tipo de retrocesso, sabe? Voltar no tempo.” O editor  da revista respondeu à ela: "Claro, se você não quer ser destaque, então eu te dou certeza  que você não será mais apresentada em qualquer uma das publicações que temos.” Angela rebateu: "Eu não quero ser parte disso. Não estou bem com isso. Isso é péssimo Revolver magazine! É dar luz àquelas porcarias que acontecem no backstage, dar luz à um par de seios e todas aquelas histórias loucas de turnê. Eu nem ao menos sei que tipo de música aquelas garotas tocam porque isso não vem escrito nos textos. O Arch Enemy não sai nas páginas desta revista há mais de três anos, eu posso muito bem viver sem isso... Eu odeio o Hottest Chicks in Metal/Hard Rock. É tão constrangedor para as mulheres. É constrangedor para as mulheres músicas que são músicas de verdade. Eu acho que o Arch Enemy não aparecerá mais nas páginas dessa revista depois desta minha discussão com o editor.” E ainda acrescenta: “Eu não uso roupas femininas para chamar a atenção, eu uso porque é meu estilo.
Angela bateu boca publicamente com o editor da Revolver.

Shamaya Otep também comenta sobre o assunto: "Quando vejo as mulheres apenas se permitindo a conseguir as coisas pela estética e se limitando a certos papéis... Eu acho que limita as escolhas para o resto de todas nós. Quando você tem pessoas que estão dispostas a aceitar esse tipo de cidadania de segunda classe...Nós não somos socializados [na indústria da música] para aceitar mulheres com base na qualidade de seus trabalhos, em vez de sobre a qualidade da sua aparência. Espero destruir esse paradigma e abrir as mentes daqueles dispostos a evoluir.


Grog da Die So Fluid
Grog da banda hard rock Die so Fluid diz que mesmo estando há dez anos na cena, ainda recebe atitudes de como se fosse uma novata: “Eu não peço desculpas pela minha aparência, eu estou nisso pela musica, tenho que trabalhar muito pra ter menos reconhecimento que os homens. O HM ainda é um clube masculino, se não fosse, porque teríamos de responder perguntas ou participar de matérias sobre mulheres no metal? Você não vê revistas com 3 caras dizendo o que é ser um homem na cena, você vê?  Existem algumas bandas que fizeram ter uma frontwoman ser uma atitude cool, como aquelas bandas com vocais semi operísticos e as bandas screamo. Pra mim, isso é inaceitável. Vender as garotas como sendo apenas super femininas ou como versões masculinas estereotipadas. Se o rock limita sua expressão pessoal neste nível, então isso não pode ser considerado uma forma real de arte. A idéia de que a mulher tem alguma vantagem por usar seus atributos físicos é ofensivo e sexista. E errado! Como se só isso fizesse as coisas fáceis...Se as mulheres fazem isso intencionalmente, então provavelmente é um passo pra elas aumentarem os seios, terem desordens alimentares ou levarem alguns tapas. As mulheres que optam serem apenas um par de seios e não terem talento dificultam as outras mulheres de terem alguma credibilidade.” Grog ainda diz que é muito chato ouvir frases do tipo que a banda só faz sucesso porque a vocalista é bonita.


Nina Saile do At Odds With God, diz que não gosta da quando a garota da banda é referida como “apenas mais um dos caras”. Na cabeça masculina soa como igualdade mas você nunca vê um rapaz, no meio de suas amigas mulheres ser chamado de "ele é apenas mais uma das garotas". Isso sim seria igualdade. “Eu já fui chamada de “mulher macho” por amigos, parceiros, colegas e estranhos, mas isso me faz rir, porque minha aparência é super feminina! O mesmo para a frase que diz que as mulheres “tocam como um homem", ser independente, confiante, forte e extrovertida não me faz ser mais homem do que mulher. Estes são todos os falsos conceitos e pensamentos de valor tradicional. Temos que começar a ver as coisas de uma perspectiva diferente.

Leather Leone disse em uma entrevista de 2011: "os poderosos perceberam que dá lucro fazer metal feminino. O que eu diria às mulheres que estão começando suas carreiras no metal: não tirem a roupa!"

Maria Brink de In This Moment, Lzzy Hale do Halestorm são do grupo de garotas que gostam de usar a sensualidade, seja por motivos próprios, seja pra chamar a atenção para suas respectivas bandas. Elas não se importam de ser objetivadas e até gostam de brincar com os estereótipos que os homens criam para elas. Maria Brink, numa entrevista reclamou que a cena HM é mais fácil para os homens porque "eles não tem que usar salto!" (??). 

Maria Brink gosta de ser a pin-up do Metal, sempre fazendo menção de levantar mais a saia.

Uma boa forma de observar  a diferença entre homens e mulheres é analisar fotos de bandas. As bandas masculinas tem um foco longe e distante, pernas abertas e mãos cruzadas indicando agressividade ou poder. Algo como: “fique distante”. A garotas do metal gótico ou sinfônico (muitas vezes) tem um olhar solitário e distante e as mais sensuais encaram a lente da câmera com olhos fixos e convidativos e às vezes um leve sorriso ou uma boca meio aberta. 

Com mais mulheres em bandas, mais mulheres no publico, mais diversidade de estilos e sons se aproxima a paridade de gênero na subcultura? Pode ser.
A presença de mulheres na cena não significa que a imagem de macho do artista de HM foi subvertida. Na verdade, pode-se argumentar o contrário. Calças de couro justas num homem não significa a mesma coisa que calças de couro justas numa mulher ou mais frequentemente, uma minissaia de couro apertada. 
Na subcultura HM quando um headbanger tem uma namorada, é comum que ela não compartilhe dos mesmos gostos musicais pela música. A resposta mais comum entre os pesquisadores/sociólogos é que “ela é uma garota” ou seja, numa subcultura machista, os homens não apenas esperam que as mulheres não gostem de metal como preferem que seja daquele jeito. Inconscientemente, para eles, as mulheres que ouvem heavy metal renunciam ao seu gênero e fingem ser um dos meninos, sendo assim são menos sexies e excitantes, já que poder e agressividade não são valorizado quando vindo de uma mulher. Por isso garotas de fotos como as da Hottest Chicks fazem tanto sucesso entre os homens, a música que elas fazem fica em segundo plano.



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Estes últimos posts sao imensos porque este é um assunto muito interessante e raramente abordado de forma mais profunda, mesmo em livros e na área acadêmica. A idéia de abordar o machismo na cena HM surgiu no Facebook do blog, já que este é um assunto meio que tabu dentro da subcultura.
Espero que daqui um tempo as garotas do rock/metal não sejam mais questionadas em entrevistas como é ser uma mulher na cena ou terem sua sensualidade colocada em primeiro plano sobre a musica. Toda mulher é naturalmente sensual e tem o direito de expressar sua sensualidade, mas isso não pode ser a primeira coisa que se julga numa mulher em seu emprego (sim, porque ser música É o emprego delas).

Citando algumas bandas nacionais formada por mulheres ou com vocalistas, porque eu não esqueci delas não: Panndora, Sacrificed, Scatha, Volkana, Shadowside, Rhevan, Holiness, Ravenland, Madame Saatan, Exhortation, The Knikers, Losna, Sacrificed, Nervosa, Cauterization... entre outras muitas.

Panndora, Fernanda Terra e Maysa (Cauterization):

A grande questão em torno de tudo isso é que o machismo no HM nem sempre é tão explícito como em letras ou capas de álbum. Ele costuma ser disfarçado em gestos, atitudes e claro, muito raramente um homem expressará abertamente seu preconceito porque sabe que será hostilizado. Então o machismo é velado, tão velado que até para algumas mulheres passa despercebido.

Próximo post: A Moda Feminina Heavy Metal 

Veja também: 
As Mulheres no Heavy Metal – Parte 1 (Visão Geral)
As Mulheres no Heavy Metal – Parte 2 (Década de 1970, 1980 e 1990)


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Fontes pesquisadas: Extreme Metal: Music and Culture on the Edge de Keith Kahn-Harris; Heavy Metal: The Music and its Culture de Deena Weinstein.


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21 de março de 2013

As Mulheres no Heavy Metal – Parte 2 (Década de 1970, 1980 e 1990)

Na sociedade, atributos femininos são rotulados como: "suave ou fraco", introvertido, carinhoso, misterioso, emocional, dependente, romântico... enquanto atributos rotulados como masculino são: "forte", ativo, extrovertido, rápido, funcional, racional, enérgico, independente, agressivo e assim por diante. A verdade é que cada um de nós, independente ser homem ou mulher tem uma mistura destes atributos. Um homem ainda é um homem se ele for introvertido ou romântico, uma mulher ainda é uma mulher se ela é extrovertida ou enérgica. No Heavy Metal, uma subcultura criada por homens jovens de classe trabalhadora, o machismo sempre foi uma forte característica. E o machismo acredita piamente no separação de gênero dos atributos citados acima. A misoginia é recorrente em capas de álbuns, letras de música ou fotos promocionais do HM. Em muitas letras, as mulheres não tem um nome próprio; entretanto, as groupies são comemoradas em letras e vídeos, suas imagens são o modelo padrão para as mulheres dentro da subcultura, uma mulher idealizada no imaginário masculino: sensual, receptiva e fisicamente perfeita.
Por conta de todo estes históricos, as mulheres da cena tem às vezes a árdua tarefa de tentar provar que são "sérias" e sabem tocar pra ganhar respeito entre os homens.

Veja também: As Mulheres no Heavy Metal – Parte 1 (Visão Geral)


Década de 1970 - 1980
Girlschool (1980) foi durante alguns anos a única banda de metal só de mulheres, elas estão na ativa até hoje e viram uma quantidade forte de preconceito ao longo da carreira. Outra banda injustamente esquecida é a Rock Goddess. As meninas  tinham 16 anos quando lançaram o primeiro álbum em 1983, mas tiveram diversos problemas e a banda se desfez em 1988. A Rock Goddess foi uma banda revolucionária para sua época, já que além de tocarem com energia e paixão juvenil, inseriram elementos românticos nas letras, algo novo no heavy metal naquele momento.

Rock Goddess e Girlschool (foto atual):



Leather Leone, do Chastain tinha um vozeirão forte e agressivo, perfeito para o estilo Trad Metal. Ela e Doro Pesch do Warlock foram as mulheres mais bem sucedidas na cena Metal da época. Doro relata que em diversas sessões de fotos foi orientada pelo empresário a expor mais seu decote. Já Leather Leone diz sempre ficava sabendo pelos colegas de sua banda o que se comentava nos bastidores sobre ela ser mulher. Anne Boleyn da Hellion e Betsy Bitch também tinham vozes marcantes e um estilo sexy agressivo e Sabina Classen do Holy Moses, uma das primeiras a cantar gutural, tinham um visual mais tradicional e thrash.

Betsy e Sabina em fotos recentes:



A cena Hard/Glam Metal foi mais favorável às mulheres no estilo, nas cores, na ênfase na moda, nos penteados... As integrantes da banda Vixen, visualmente eram quase indistinguiveis das bandas masculinas tamanha a androginia. Elas foram alvo de desconfiança e tiveram dificuldade de arranjar contrato com gravadora, fizeram diversos showcases para provar que sabiam tocar ao vivo. 


Lita Ford (ex-Runaway) foi a mulher que teve o maior sucesso mainstream da década. Assim como muitas das mulheres na cena hard, ela explorava bastante a sensualidade no estilo e nas letras. Mas ela foi das poucas que soube ser sexy e ter controle sobre sua carreira. Um dos vídeos que mostra bem o estilo dela:



A guitarrista de Speed Metal The Great Kat e seus biquínis de couro e tachas tem uma das mais raras imagens vistas na cena metal em seu portifólio: uma contracapa de álbum em que domina dois homens ao mesmo tempo. Kat, sempre procura músicos pra tocar com ela: "Eu lhes dou partituras, eles devem estar preparados para lê-las. Se eles não sabem, eu dispenso.” Ela, aparentemente não se importa com o pouco caso que os metallers  fazem dela: "Quem se importa com o que os idiotas pensam?". Kat é uma mulher que tem aqueles atributos que citei no primeiro parágrafo do texto: ela é forte, ativa, extrovertida, rápida, enérgica, independente, atributos geralmente direcionados aos homens, talvez por isso ela assuste e seja criticada por alguns deles...



Já as garotas do Meanstreak, que foram provavelmente a primeira banda de Thrash feminina, nunca tiveram uma promoção decente de seu único álbum  e duraram apenas de 1988 a 1992 sem nunca terem saído do underground. O mais curioso sobre a banda é que três integrantes são casadas com três membros da banda Dream Theater. 

Impossível não citar também o vozeirão de Gigi Hangach da Phantom Blue. O apelo estético delas era menos sensual e mais glam, mas infelizmente lançaram apenas dois álbuns.




Muito couro, botas de cano longo, meias arrastão, studs... esses eram elementos muito usados pelas cantoras de Hard and Heavy Metal da época.  A cantora Steffanie que depois de sua carreira solo substituiu por um tempo a cantora Keiko Terada na banda Show-Ya, tem um clipe que mostra bem isso: Hideaway 



Citando apenas mais algumas bandas e vocalistas femininas da época: Debbie Gun (Sentinel Beast); Biró Ika (Metal Lady);  Yvonne Durand (Zed Yago), Jutta Weinhold (Zed Yago), Femme Fatale, Ice Age, Oral...

Durante a década de 1980, o que vimos foi isso: muitas mulheres na cena hard e no HM tradicional, mas à medida que a década chegava ao fim, não houve  grandes avanços em termos de participação feminina. 


Década de 1990
No começo dos anos 1990, muitas bandas femininas ou com mulheres no vocal tiveram uma decadência. Lita Ford lançou discos sem sucesso e Doro Pesch migrou pra um Hard and Heavy e se manteve no mercado underground com uma boa base de fãs. Com o Heavy Metal tradicional em baixa, nenhuma gravadora apostava mais no estilo. O Death e o Thrash ainda conseguiam se manter no mainstream através de bandas como Metallica e Slayer, mas nenhuma banda com mulheres se destacava neste meio sonoro.

Naquela época, as Riot Grrrls, cujo uma das líderes era Kathleen Hanna da banda Bikini Kill, ajudou a mudar a imagem da mulher no rock. Apesar das Riot terem surgido na cena punk, a terceira onda do feminismo acabou se espalhando pelo rock em geral. Se no Heavy Metal, as mulheres precisavam ter atributos masculinos ou um apelo sexy, na cena Riot, a mulher podia ser feminina, expressar-se livremente e ter opinião própria. 
Seattle tinha uma cena underground muito desenvolvida, as meninas aproveitaram  pra se organizar e colocar seus desejos e pensamentos feministas em fanzines punk rock e formando bandas de garagem. O lema era: “se os homens podem, eu também posso!”. E assim, amparadas por mulheres de personalidade e alguns rockstars homens, a partir de 1995, começou um aumento no número de mulheres na cena rock e heavy metal tanto nos EUA quanto na Europa, mas de formas diferentes... 

Mais especificamente a partit de 1996 aconteceu um aumento repentino e maciço de artistas mulheres em bandas. 
Num dado momento daquele ano, Karyn Crisis (banda Crisis) era a "única mulher em turnê em qualquer lugar do mundo do metal”. Karyn realmente quebrou barreiras para as mulheres com vocal extremo no sexista e misógino início dos anos 90 nos EUA. Quando concordou em fazer parte da banda que iria se tornar a Crisis, o baixista original pediu demissão ao saber que uma mulher seria parte do grupo, “Ele queria estar em uma banda de rock 'n' roll com, você sabe, sexo, drogas e rock 'n' roll". Ela conta também que naquela época, a idéia de ter uma mulher em um grupo de metal era tão radical que os proprietários dos clubes se recusavam a aceitar a banda ou dar a eles um cachê. A platéia também era hostil, muitos viravam as costas quando ela se apresentava alegando que mulheres não deveriam cantar gutural. 


Karyn Crisis

A banda Kittie, uma das únicas bandas ativas formada apenas por mulheres nos anos 90, também passou por sufocos. As quatro adolescentes eram "crias" da cena Riot, tinham letras feministas, compunham as próprias músicas e foram habilmente comercializadas pela gravadora como “the next big thing”. A idéia de quatro garotas rebeldes em uma banda era tudo que a mídia precisava naquele momento. As meninas fizeram um grande sucesso em 1999  que as levou a participar de duas edições do Ozzfest nos anos seguintes. A vocalista Morgan Lander diz:


"Quando formamos a banda em 1996, nós não tínhamos idéia sobre as implicações de ser uma "banda só de garotas", nem entendíamos o peso e a responsabilidade que carregávamos. Não tínhamos idéia de que haveria um grande debate na mídia em torno do que era ser uma mulher no Metal, tomando posse sobre o que é percebido como papel masculino. 
Nós éramos apenas um grupo de amigas que queriam se divertir fazendo música. Era tudo muito inocente. Nós fomos acusadas​ de não escrever nossas próprias canções e sentimos a pressão de ter de atingir um certo tipo de estética física, que eu rapidamente descobri que era quase impossível. Como uma mulher na cena Metal, eu achei perturbador que estávamos sendo julgadas não por nosso mérito musical, mas pela nossa aparência, o modo como nos vestimos, nosso peso. Fomos rotuladas de "a mais bonita", "a feia", "a exótica" etc. Rótulos que foram todos feitos para nos envergonhar ou nos separar. Me sentia reduzida à peitos e bunda, percebi que se quiséssemos ser levadas à sério, tínhamos que andar uma linha tênue entre feminino e masculino. 
Eu estava muito preocupada com a nossa música e credibilidade, e por alguns anos, fiz questão de vestir mais "masculina" para que minha feminilidade não se destacasse. Eu raspei minha cabeça e não usava maquiagem como uma espécie de ato de rebelião. Eu não queria ser vista como um objeto e estava irritada em como a banda era apresentada negativamente nas notícias. 
Tem sido uma luta enorme superar a forma como fomos retratadas ao longo de nossa carreira e ter de "provar" sermos uma banda digna de louvor dentro da comunidade Metal. Não é o gênero que importa. O melhor conselho que posso dar é ser bom no que faz, pratique e aprimore seu ofício. O clichê "não leve desaforo de ninguém" é muito importante quando se lida com esta indústria. As pessoas vão te perguntar: "você é namorada de quem?", ignore, porque a melhor vingança é subir ao palco e ser ótima no que faz."


Marta do Bleeding Through, Tairrie B. do My Ruin, Nadja Peulen e Rayna Foss (ambas ex-Coal Chamber) também eram garotas na cena HM dos anos noventa.



Ainda em meados dos anos 90 bandas de Gothic e Black Metal, inseriram mulheres como coadjuvantes, fazendo backing vocals e não contribuindo nas composições. Kimberly Goss (Ancient, Therion, Dimmu Borgir) e Sarah Jezebel Deva (com o Craddle of Filth a partir de 1996) foram das primeiras a  participar desse novo movimento. 


Sarah, uma das primeiras backing vocals da cena HM européia
Bandas lideradas por mulheres ou formada apenas por mulheres não estavam em voga na Europa como estavam nos EUA e na Inglaterra. Lá a tendência era ter mulheres em bandas fazendo vocais semi operísticos e visualmente etéreas e distantes: Theatre of Tragedy (1995); Theatres des Vampires (1996), Tristania (1998), Lacuna Coil (1999) são alguns exemplos. Mas banda que mais ganhou destaque foi Nighwish (1997).



Surgiram consequências negativas devido a essa tendência européia de vocalistas mulheres em bandas de Metal. Grandes gravadoras perceberam o sucesso de bandas como Theatre of Tragedy, Tristania e Nightwish e começaram a assinar contratos com toda banda que tivesse uma garota. Surgiram então, bandas feitas especialmente pra atrair o publico masculino (vocalistas bonitas) e o feminino (a vocalista também era estilosa) algo percebível que tanto a gravadora quanto os músicos estavam conscientes da conexão histórica entre sexo e rock'n'roll e estas vocalistas raramente tinham poder de decisão ou de composição dentro das bandas (continua na parte 3).

As Mulheres no Heavy Metal – Parte 3 (Década de 2000) 





Veja também: 
Documentário: Mulheres no Metal


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