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31 de dezembro de 2017

A História de Bettie Page: A Rainha das Pin-ups

Ícone para várias subculturas, a modelo Bettie Page teve uma carreira curta, de apenas sete anos. Neste período se tornou a mais importante modelo pin-up da década de 1950 posando em fotos sensuais e de fetiche. Até hoje é difícil separar quem ela era da personagem que interpretava nas fotos. Sua vida pessoal foi cheia de tragédias, chegando a ser presa por esfaquear uma mulher. Fique agora com nosso artigo - e também uma homenagem - a uma das  pioneiras da revolução sexual feminina.

Em sete anos de carreira o visual de Bettie Page nunca mudou, 
isso deixou sua imagem atemporal.
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Bettie Mae Page nasceu em 22 de abril de 1923 em Nashville, Tennessee (EUA) em uma família de baixa renda que se alimentava somente de feijão, macarrão e batatas fritas. O pai abusava sexualmente das irmãs de Bettie, ela, se negando a ceder, o deixava acariciar suas pernas em troca de 10 cents. A mãe, analfabeta, fugiu com os filhos mandando as garotas para um orfanato. Lá, Bettie e sua irmã eram maltratadas, passavam o tempo sonhando com Hollywood e imitando as poses das atrizes. Logo Bettie se casaria com o namorado Billy Neale e em 1944 começa a fazer testes para o cinema. O casamento duraria pouco, após retornar da segunda guerra, com ciúme, Neale a ameaça com uma faca; ela decide se divorciar.


A jovem Bettie Page.
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Bettie era apaixonada por dança e ia aos bailes sozinha, este hábito permanece até mesmo quando se muda para Nova Iorque em 1947, onde passa a trabalhar como secretária e conhece o homem que ela chama de "amor de sua vida",  o peruano Carlos Garcia Arrese, exímio dançarino que a ensinou mambo, tcha tcha tcha e até samba! O romance acaba quando Page descobre que ele já era casado. A partir daí ela decide correr atrás de ser modelo, mas não era magra o suficiente para a agência Ford Models. Ao passear por Coney Island em outubro de 1950, é abordada pelo policial e fotógrafo amador Jerry Tibbs que a convida para modelar como pin-up. É ele quem sugere que ela corte uma franja pois sua testa seria "muito grande". E assim, aos 27 anos começa a carreira de modelo de Bettie. Para conseguir trabalho, ela alterava sua idade para 22 anos.


Num de seus primeiros trabalhos como modelo.
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A franja curta historicamente sempre existiu, sendo inclusive moda na década de 1950 para adolescentes. Foi com Bettie que o penteado ganhou um status mais significativo culturalmente por ser uma franja "cheia" e curvada em direção à testa.
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Na década de 1950, existiam os Clubes de Fotografia, onde fotógrafos amadores e profissionais poderiam treinar técnicas em modelos que se ofereciam gratuitamente ou por um valor irrisório para posar. No Clube que Bettie posava, haviam 40 fotógrafos, além de outras quatro modelos.


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Mas Bettie se destaca pelo carisma e possuía pose, traje e expressão, fatores que definem ser uma pin-up. O que a tornou um destaque entre todas as outras modelos era a combinação de safadeza e boa moça. Bettie sempre sorri em todas as fotos e vídeos enquanto seu corpo sensualiza ou rebola incansavelmente.


Bettie sempre estava sorrindo, ela se tornou a rainha das Pin-ups.
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Embora no Brasil cabelos escuros sejam um padrão de beleza admirado pela cultura de massa, na América da década de 1950 era algo exótico.
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Inteligente, não fumava nem bebia e fazia suas próprias roupas de fotografia. Todas as lingeries e biquínis era ela mesma quem desenhava, adorava costurar! É por isso que vemos somente Bettie usando determinadas peças e não vemos outras mulheres da época, já que seus figurinos dizem respeito a si mesma e não à moda do período.

Bettie vestindo biquinis feitos por ela:
uma das primeiras mulheres a usar a peça.
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À direita Bettie num maiô, traje de praia padrão habitual para as mulheres da década de 1950; à direita, numa de suas lingeries. 

Sendo uma das poucas a usar biquíni, a marca Charmands a chama para tirar fotos com seus biquínis, mas a empresa copiou todas as suas peças e as vendeu em um catálogo. Page nunca recebeu um centavo pelo roubo de suas criações.

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Sua fama como pin-up a fez modelar para as principais revistas sensuais e de fetiche da época: Beauty Parade, Wink, Titter, Flirt e até fotonovelas de Robert Harrisson. Fez fotos com outras pin-ups e dançarinas burlescas da época, como Tempest Storm.

Bettie com Tempest Storm no filme Teaserama

No entanto, era década de 1950, e a moralidade imperava. A sociedade da época vivia um medo da pornografia e da delinquência. Sexo era tabu, nudez era algo obsceno.Todas as revistas de nudez e fetichismo circulavam em segredo. Bettie percebeu a oportunidade de ganhar mais dinheiro quando passou a posar nua por até 20 minutos em sessões de fotos. Numa das vezes chegou a ser denunciada, indo parar na delegacia acusada de obscenidade e desordem. 


As medidas corporais de Bettie eram: 91 cm de busto, 60 de cintura e 94 de quadril. Ia a academia 3x por semana.
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Em janeiro de 1955 esteve nas páginas da revista Playboy em uma de suas mais conhecidas fotos: ao lado de uma árvore de natal. O acontecimento levou Bettie aos olhos de um público maior e Hugh Hefner a intitulou a "The Miss Pin-Up Girl of the World". 
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Foi através do editor Robert Harrisson que ela conheceu o fotógrafo Irving Klaw e se tornaria sua modelo mais famosa. Klaw tirou pelo menos 1500 fotos de Page e as vendia para soldados. Criava também filmes 16 mm sob temática fetichista onde Bettie ganhava cerca de $150 por filme. A irmã de Klaw, Paula, se torna amiga e admiradora de Bettie e dá à modelo um par de calçados altíssimos para ser usado exclusivamente por ela nas sessões de fotos. Através da dupla, Bettie se torna a rainha do Bondage, suas fotos e vídeos eram enviadas pelo correio aos interessados.


Com Irving e Paula Klaw.

Segundo Bettie, todas as fotos bondage que fez eram atuação, seguia as instruções de Irving e Paula para interpretar uma personagem. Nas fotos abaixo ela usa o sapato de saltos altíssimos que Paula dava à ela nas sessões fotográficas. As fotos S&M eram as mais vendidas de Klaw.
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Em 1955, o FBI bate à porta e Klaw vai a julgamento por pornografia onde é sentenciado a destruir todas as suas fotografias, mas sua irmã esconde os negativos com as fotos de Bettie, ela já sabia que aquelas fotos seriam históricas. Assim salvou-se as fotos de não serem destruídas, no entanto, o acontecimento destrói a carreira de Klaw que opta por não mais trabalhar no segmento.

Uma pin-up foi muito importante na carreira de Bettie, a também fotógrafa Bunny Yeager, que fez fotos de Page em 1954 quando a modelo estava com 32 anos (e dizia ter 24). É dela boa parte dos ensaios externos mais famosos da carreira da modelo: em praias, parques e com animais. Yeager foi autora da foto com temática natalina que foi parar na Playboy de janeiro de 1955.

Com Bunny as fotos de fetichismo visando o público masculino ficam em segundo plano. Yeager faz as fotos de Bettie ganharem um ar mais sofisticado, exótico e numa variedade de temas.

Bettie Page com Bunny Yeager na famosa sessão de fotos.

A variedade e o exotismo entram em cena.

Yeager faz fotos sofisticadas de Bettie.


O começo do fim
Sem Irving Klaw, Bettie continua a trabalhar com os clubes de fotografia. Numa ocasião é embebedada e durante uma sessão de fotos nuas, é fotografada de pernas abertas. As fotos são vendidas. Arrasada, Bettie decide sair de Nova Iorque. Aos 34 anos passa a se achar velha para ser modelo. Desaparece e deixa tudo para trás.

O desaparecimento
Bettie optou por se esconder, não queria ser encontrada. A modelo sempre foi religiosa, mas não via a nudez como pecado. Em 1958 chora em frente à uma igreja acreditando que Deus a estava castigando, se compromete com a religião recebendo Jesus como seu salvador. Joga fora todas as suas meias, lingeries, biquínis e vai para a Faculdade Bíblica com o intuito de se tornar missionária. Em 1966 viaja para Miami e conhece Harry Lear, com quem viria se casar em 1967, é nesta época que o fanatismo religioso toma seu auge, já que passa a alegar ouvir vozes o tempo todo. Enlouquece ameaçando Lear e os filhos dele com uma faca caso parassem de olhar a imagem de Jesus pendurada na parede. Lear consegue escapar, chama a polícia e Bettie é internada na ala psiquiátrica do hospital Jackson Memorial onde fez tratamento de choque. Ao sair da instituição em 1978, num surto psicótico dá de 20 a 30 facadas na proprietária do apartamento que alugava. Alega insanidade, recebe pena de 10 anos na cadeia Estadual além de ter que ir três vezes por semana ao psiquiatra sob o diagnóstico de esquizofrênica paranoide.

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Foto do fichamento de Bettie Page em 1972.

Após esse período, Page retorna à Los Angeles e passa a viver na pobreza com ajuda do seguro social do governo, pois nunca recebeu dinheiro pelos direitos de suas fotos.

Enquanto o mundo vivia a revolução sexual da década de 1960 com Hippies, minissaia, moda unissex, pílula anticoncepcional, Bettie Page, pioneira da liberdade sexual feminina estava escondida. É aí que começam os primeiros indícios que ela se tornaria um ícone cult. Como ninguém sabia de seu paradeiro, começou-se a espalhar a ideia de que a ex-modelo havia se suicidado.

Na década de 1970, a década da nudez, a pornografia deixa de ser crime, as leis são revisitadas, a década de 1950 passa a ser romantizada, filmes como "Grease" são lançados, surge uma nova onda Rockabilly e a geração jovem da época redescobre Bettie. A imagem de Page começa a surgir em diversos produtos de consumo.

Bettie era chamada de Dark Angel pelos fãs que julgavam ela ter se suicidado.
Na década de 1960 se tornou símbolo da liberdade sexual feminina.


Na década de 1980, a imagem de Page domina a cultura pop, ela influencia fortemente as garotas de diversas subculturas que redescobrem suas fotos e passam a imitar seu visual. Aumenta a presença de sua imagem em souvenirs e objetos de consumo.  


Olivia de Berardinis pinta quadros de Bettie para meninas que admiravam a modelo.


Após 30 anos sem ter sua imagem impressa, Dave Stevens publica a The Rocketeer Magazine. 

Nos anos 1980 e 90 a imagem de Bettie Page abre caminho para fotógrafos e estilistas de Moda influenciando nomes como Jean Paul Gaultier, Thierry Mugler e artistas como Madonna, inspirada por Page no clipe da música "Human Nature".

Tudo começa a mudar em 1992 quando Steve Brewster cria um fã clube dela, o Bettie Scouts Club e decide por si mesmo encontrar Bettie viva ou morta. Passa a viajar pela América procurando-a e coloca anúncios em diversas publicações até descobrir o seu irmão, que faz a intermediação de uma carta que Brewster escreve para ela em abril de 1992. A resposta vem em dezembro do mesmo ano. Bettie estava viva!


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Finalmente encontrada, estava lisonjeada por ter um fã clube, mas prefere se manter fora dos holofotes. Dave Stevens é quem passa a ajudá-la neste momento, quando leva-a a uma loja onde haviam diversos produtos sobre ela. Espantada, se impressiona pelas pessoas admirarem seus trabalhos tanto tempo depois. Stevens a coloca em contato com Hugh Refner que faz uma festa privada em sua homenagem na mansão Playboy, o que rendeu uma das raras fotos da ex-modelo já idosa.


Bettie Page, à direita, em festa em sua homenagem na mansão Playboy.

Com Anna Nicole Smith e Pamela Anderson na festa de 50 anos da Playboy em 2003.

Hugh Hefner, que fez seus milhões em cima da objetificação do corpo feminino*, oferece a ela um agente para cuidar dos direitos autorais**, para que a partir de então Page receba dinheiro do uso de sua imagem. A partir daí, cada produto com a imagem de Page precisa ser autorizado por ela mesma. Em 1996, é lançada sua única biografia autorizada. Finalmente a ex-modelo passa a ganhar dinheiro devidamente.

Desde que foi encontrada Bettie se negou a ser fotografada e filmada, ela morava na periferia de Los Angeles. Nas palavras dela: "preferia estar escondida."
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Bettie falece em 11 de dezembro de 2008 aos 85 anos após um ataque cardíaco que havia a deixado em coma. Um fato curioso é ela ter falecido no mesmo ano em que Maila Nurmi e no mesmo dia do aniversário da intérprete de Vampira. Fica aquela questão: elas foram contemporâneas, será que conheceram o trabalho uma da outra? A curiosa ligação de vida e morte não é só o que as une já que ambas tiveram um vida difícil e foram resgatadas por subculturas.


Na cultura pop: Madonna, Beyonce, Christina Aguilera e Katy Perry foram algumas das que se inspiraram no visual da pin-up.


Dita von Teese revelou: Eu a admiro e a estudei muito de perto. Quando comecei em 1990 queria ser sósia de Bettie Page. Queria ser uma fetish star famosa como ela. Não era o cabelo preto e a franja que a faziam memorável, pra mim era o senso de humor brincalhão, era o jeito aventureiro.



Bernie Dexter é uma pioneira modelo pin-up da contemporaneidade. Se tornou conhecida na década de 2000 por sua semelhança com Page.
À direita, caminha ao lado de Tempest Storm no funeral de Bettie.




Bettie é amada e serve de inspiração para muitas de nós brasileiras, especialmente no estilo de cabelo e também por ser a primeira referência visual para ensaios fetichistas.  

Rosana (Bettie From Hell) tem fisionomia que lembra a Bettie Page, Sarah Amethyst e Larissa (Murder Queen) em ensaios fetichistas.


Desde os anos 1990 até hoje, Bettie Page cresceu sua influência na cultura pop, com inúmeros exemplos de artistas e modelos se inspirando em sua imagem. Sem contar sua importância em diversas subculturas como a gótica, punk, rockabilly e pin-up. Sua figura ganhou novo fôlego na última década com a popularização da internet. Mas a relação de Bettie e as subculturas é um assunto tão vasto que prefiro abordar em detalhes num futuro post. A imagem de mulher livre em plena década de 1950, revolucionária a seu modo, se tornou e permanece icônica para várias gerações.


"Quero que as pessoas se lembrem de mim como eu era nas fotos".
Com certeza é assim que Bettie Page repousa em nossa memória. 


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Texto escrito por Sana Skull, proibida a utilização de trechos sem autorização prévia da autora, cite o link em caso de referência.

*Há controvérsias se Hugh Hefner a ajudou ou a explorou.
** Direitos de Imagem

Fonte: entrevistas documentadas em primeira pessoa com Bettie Page. 
Autoria: Idealização, texto e seleção de imagens de Sana Skull.


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27 de dezembro de 2017

A história da subcultura Chola: conheça as gangs de garotas latinas.

A subcultura Chola tem suas origens na cultura pachuco da década de 1940 e possui identidade marcada pela segregação e racismo históricos, guerras de gangues, violência, pobreza e papéis de gênero conservadores. Sua estética não é apenas moda, mas uma declaração simbólica sobre luta e identidade conquistada.

Existe uma história de resistência e resiliência entre as mulheres
mexicanas-americanas da Califórnia, também chamadas de Chicanas. 

Para entender as origens das cholas, é recomendado ler o artigo sobre a subcultura Pachuco, onde é abordada a opressão e discriminação das comunidades latinas nos EUA no começo do século 20. As Pachucas, antepassadas das cholas, eram donas de um estilo não conformista e rebelde. A transição do estilo de pachuca para o chola ocorreu a partir da década de 1960, mas foi na década de 1990 que viveu seu auge no underground influenciando também a cultura dominante.

Acredita-se que a palavra "Chola" deriva de Xolotl, um antigo deus Asteca que  guiava os mortos para o submundo. Quando os espanhóis conquistaram o império asteca no século 16, as crianças de mistura espanhola e ameríndia eram insultadas como 'xolos'. No começo do século 20, quando ocorreu a migração mexicana para as áreas pobres de Los Angeles, eles foram chamados de 'cholos' e então, na década de 1960, a classe trabalhadora mexicana retoma o termo e o subverte como símbolo de resistência durante o movimentos dos direitos civis chicanos: o Chicano Power ou Movimento Chicano.

Assim, "Cholo" identifica méxico-americanos ou chicanos afiliados à gangues do sul da Califórnia. Os grupos latinos ofereciam um senso de família e orgulho, identidade e pertencimento e em alguns casos proteção. Chola define as jovens latinas que são parte de gangues.

Cholas: jovens latinas pertencentes à gangues.


Gangs
Culturalmente associamos gangues a situações negativas, mas como vimos na postagem dos Pachucos, as gangues chicanas surgiam como uma forma de proteção e resistência contra a opressão. A cara fechada demonstra desprezo ou apatia pela sociedade que os exclui. Os cholos e cholas se envolvem em gangues visando a auto proteção nas ruas. Assim como seus pais e avós, eles valorizavam o conceito de família, eram orgulhosos de sua etnia e defendiam sua identidade e a lealdade entre os companheiros. As garotas latinas envolvidas em gangues na década de 90 são conhecidas como Homegirls.


Homegirls: "Aztek Nation" e "Brown Sugar Crew", gangues de garotas chicanas nos anos 1990.

Estilo de Vida
O estilo de vida da subcultura chola demonstra interesse musical por hip hop, o rap chicano, gangsta rap e até mesmo rockabilly e punk rock. Há a cultura Lowrider, criada pelos mexicanos-americanos no começo do século 20, documentado nas páginas de publicações como Teen Angels que destacava arte, moda, tatuagens e códigos morais. Alguns filmes retrataram a subcultura, como Corredor Polonês (Walk Proud, 1979), Boulevard Night (1979) e Mi Vida Loca (1994), sendo este o mais famoso e que se tornou cult por mostrar a vida e os relacionamentos de quatro garotas de uma gangue em Los Angeles na vizinhança de Echo Park. As atrizes selecionadas eram pertencentes a gangues reais. A diretora Allison Anders, se disse interessada em mostrar a subcultura como cultura pop, abrangendo música, roupas, lealdade, amor e sororidade feminina.

Cultura Lowrider: carros antigos customizados.
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Bicicletas Lowrider

Páginas da revista Teen Angels.

Mi Vida Loca é o mais famoso filme sobre as Cholas.
Hoje é cult e considerado feminista.


Estética
A estética da garota mexicana-americana da periferia é composta por estilo, trejeitos e atitudes próprias e principalmente orgulho de suas raízes. 

Cabelo e Maquiagem:
Esse é o ponto mais marcante da estética chola. É composto por sobrancelhas finas e arqueadas desenhadas a lápis, olhos bem marcados podendo ter maquiagem gatinho (cateye makeup), lápis de boca mais escuro que o batom (vermelho escuro ou preto com batom vermelho vibrante), lágrima desenhada abaixo de um olho representando a opressão dos mexicanos na América. Cada gangue tem uma forma autoral de fazer a maquiagem o que permite identificar a qual pertence cada garota.

Sobrancelhas pretas e arqueadas, cateye, sombra e lápis de boca contornando os lábios: característica marcante das cholas.

À direita, cholas em 1997.

Grandes topetes ou franjas pin-up ou beehive são adornados com bandanas. É suposto que os altos pompadours são usados para esconder canivetes. Elas podem fazer pequenos cachos nos cabelos bem juntos à pele.
Tanto o cabelo quanto a maquiagem retrô podem ser interpretadas como homenagem às antepassadas pachucas, boa parte das referências remetem à década de 1940.



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Topetes e bandanas.
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Como adornos, óculos gatinha (cat eye glasses), grandes brincos de argola dourados ou prateados e tatuagens constantemente celebrando as origens mexicanas, com palavras grafadas em fonte Old English, imagens de veneração à família ou à virgem de Guadalupe.



Roupas e calçados:
As Cholas usam camisetas/regatas brancas ou estampadas com símbolos religiosos, tatuagens ou palavras na fonte Old English; por cima camisa xadrez oversized abotoada só no primeiro botão. A barriga de fora é comum assim como suspensórios, longas correntes e cintos com grandes fivelas. Jeans ou calça baggy Dickies em denim ou na cor cáqui. Como calçados, as cholas são vistas usando "chanclas" (espadrilles), tênis ou algo que permita correr da polícia, contrastando com os altos saltos usados nos eventos de lazer que costumam ser acompanhados de roupas em estilo retrô, especialmente da década de 1940, época das Pachucas.




Além do visual calça, regata e camisa xadrez, as cholas também adotam a estética retrô da década de 1940, época em que as pachucas viveram.


As pulseiras de plástico são uma marca forte na subcultura, cada menina monta do jeito que quiser, de forma única ou montam em combinação com a turma.


O Estilo Masculino:
Como vimos no post anterior sobre os pachucos, o estilo cholo de calça cáqui (Dickies) e regata branca pode ter evoluído tanto do visual militar quanto do uniforme das cadeias. O visual encontra elementos comuns ao estilo feminino: camiseta branca, camisa xadrez sobre camiseta branca abotoada só o primeiro botão, calça ou bermudas largas cáqui ou denim, tatuagens em homenagem à cultura chicana, lágrima nos olhos, bandana, óculos escuros e cabeça raspada. Nos pés, tênis. As peças são bem largas, homenageando o terno Zoot Suit dos antepassados Pachucos. Assim como as cholas, é comum os cholos formarem suas gangues, é deles a ideia de tatuagens de gangues representando o grupo ou local de origem, comumente usando a fonte Old English nas escritas.

A tatuagem de lágrima remete ao sofrimento do povo mexicano na América assim como simboliza a perda de algum ente querido. São comuns tatuagens no rosto, cabeça e boa parte do tronco.


O boné de aba reta é amplamente adotado assim como calças ou bermudas largas que lembram as calças larguíssimas do terno zoot da década de 1940.
O visual encontra paralelos no visual das subculturas skate, rap e hip hop, embora cada um destes grupos use os trajes por motivos específicos, há vários pontos em comum entre estas subculturas que influenciam umas às outras.


Cholos: "vida loca" é uma frase da subcultura 
que habita a área 818 do Vale de Los Angeles.

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Cholos e Cholas: "Brown Pride" é uma expressão que simboliza o orgulho de suas origens indígenas e mexicanas.


Curiosidade: as calças Dickies existem desde 1922, mas foi durante o período da segunda guerra mundial que sua durabilidade e conforto as tornaram pioneiras no traje de trabalho moderno. Na década de 1960 se tornou unissex e podiam ser tingidas de qualquer cor. Nos anos 1980 passam a ser desenhadas para as formas femininas e é no fim desta década que as Dickies se tornam peça fundamental da cultura latina de rua, tanto para homens quanto para mulheres por ser barata e durável. Foi adotada por skatistas, roqueiros, sendo uma das adeptas mais famosas a cantora Gwen Stefani.


Na cultura dominante
Na década de 1990 a subcultura Chola viveu seu auge no underground influenciando fortemente a cultura dominante. Uma das artistas que levou a estética ao grande público foi Gwen Stefani, conhecida pela adesão ao estilo. A cantora declarou em entrevista que as Cholas são sua maior influência: 


"As cholas... elas tinham uma maquiagem inacreditável... eu cresci em Anahein (cidade no sul da Califórnia) de imensa população hispânica, eu sonhava acordada vendo minhas colegas de sala passando maquiagem, eu ficava hipnotizada". 

Stefani homenageia as cholas no vídeo "Luxurious". Anaheim, a cidade de Gwen que fica a 2hr da fronteira com o México, hospeda o The Viejitos Summer Show N Shine um grande evento Low Rider, ou seja, a cantora cresceu num ambiente onde recebeu grande influência da cultura chicana e isso formou sua personalidade e estilo.


Gwen Stefani: regata branca, calças da marca Dickies, cinto de tecido, sobrancelhas finas, lábios contornados de cor mais escura - a cantora nasceu numa cidade Chicana, sendo fortíssima a influência chola em seu estilo pessoal.
A maquiagem chola de Gwen no vídeo Luxurious.

Kat von D
A empresária e tatuadora tem pais argentinos, mas nasceu no México. Como Stefani, von D recebeu grande influência da cultura chicana quando nova, tanto que um de seus batons é nomeado “Homegirls” e possui o tom roxo avermelhado escuro, típico de uma Chola. Ela conta: “Meu batom líquido Homegirl  foi inspirado pela primeiro batom que eu tive. Eu era muito, mas muito pobre. Muito pobre mesmo... Eu era uma garota gótica e minha irmã era uma Chola, então nós podíamos compartilhar aquele batom.”


Kat nasceu no México e posa com a irmã Karoline, que era Chola; seu batom "homegirl" - gíria que se refere às garotas de gangues.

Jennifer Lopez é de ascendência porto riquenha, conhecida por ter orgulho da cultura latina. Ela interpreta uma personagem chola no vídeo “Get Right.”



Amy Winehouse e a cantora Selena possuem referências visuais da cultura Chicana: 

Kat von D canta música de Selena:




A imagem estética da chola foi explorada também por artistas como Lana del Rey no clipe “Sad Girl”, Nicki Minaj em "Senile", Fergie, Rihanna e Demi Lovato também foram algumas que chegaram a usar o visual que também foi relido em desfile da Givenchy de Riccardo Tisci, na Rodarte e em editorial de 2012 na Vogue Itália fotografado por Steven Meisel. Em todos estes casos houve crítica por apropriação cultural da estética da subcultura.

Cholas comentando o visual de Nicki Minaj, Rihanna e Jennifer Lopez:



A estética chola é tão forte e marcante que o artista Michael Jason Enriques criou o projeto Cholafied, que através de manipulação de imagens transforma celebridades em Cholas. Divertido, mas ao mesmo tempo poderoso por mostrar como a subcultura de Los Angeles deixou sua marca na cultura americana e na cultura pop.



Como subcultura, os cholos e cholas mostram resistência à pobreza, adversidade, preconceito e dominação. Seus trajes vão além de uma declaração de moda, são de grande importância social. Para as cholas, ser parte de uma gangue é uma forma de empoderamento, muito mais do que um modismo de "squad girls" de filmes hollywoodianos, é sobrevivência, real senso de comunidade.


Chola por vida! 


Leia mais sobre o estilo Chola no blog parceiro Desvianteh! (clique aqui).
Adição de imagens: 29/12/2017


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