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20 de fevereiro de 2020

A força visual do bustiê moldado: o torso feminino como segunda pele


Grace Jones de Issey Miyake

Um bustier de plástico rosa metálico vestido pela cantora Zendaya no Grammy 2020, causou alvoroço entre os seguidores de moda devido à força estética que essa peça representa. O modelo utilizado era uma versão que Tom Ford lançou em sua última coleção Primavera-Verão, homenageando os bustos de Yves Saint Laurent da coleção Inverno 1969 e de Issey Miyake para sua coleção de Inverno de 1980. Aproveitando esse momento de resgate histórico, vamos contar alguns detalhes dessa peça adorada nas mentes dos estilistas, que apresenta diferentes significados e até hoje chama atenção por onde passa. 


O resgate que Tom Ford fez na temporada passada, trouxe à passarela diferentes estilos: busto inteiro ou sutiã, nas cores rosa, verde, preto e marrom. A peça azul desfilada por Gigi Hadid apresenta uma assimetria no formato dos seios. As criações são feitas de plástico e homenageiam os modelos apresentados anteriormente por YSL e Issey Miyake.

Segundo o Museu Yves Saint Laurent, na coleção de Alta-Costura Inverno 1969, o estilista francês fez uma parceria com Claude Lalanne, escultora que tinha um trabalho voltado à natureza, com inspiração nas formas dos animais e plantas. Lalanne usa o corpo da modelo Veruschka, conhecidíssima nessa época, para criar moldes de seus seios e barriga - que depois viraram joias de cobre desfilados com dois vestidos de chifon, um preto e outro azul. 


Não seria a primeira vez que Tom Ford traria às passarelas influência desse busto. Nos anos 2000, quando comandava a moda feminina da própria marca YSL, veria-se uma atualização na coleção Verão 2001, com direito a piercing no mamilo, porém feita de plástico e modelo inteiro, igual  Miyake.


A criação de Issey Miyake é a mais icônica, inclusive na carreira do próprio estilista, pois muitas artistas gostaram e vestiram em suas apresentações. Fabricada para sua coleção de Inverno 1980, era feita de plástico em diferentes cores como azul, verde, vermelha e preta. Segundo o MET, o busto também fora moldado no torso de uma mulher e tinha como mensagem subverter a ideia de que roupas eram uma cobertura separada do corpo, revelando os detalhes dos contornos femininos e criando uma segunda pele que se transforma em um pequeno peplum de dobras de tecido nos quadris. Interessante que essa peça encontra-se atualmente no Museu de Arte da Filadélfia, mas antes rodou o mundo na exposição "Bodyworks" de 1983 a 1985. O modelo foi um estudo de Miyake na relação entre a forma do corpo e a roupa, e a roupa diretamente de volta ao corpo. 


A força visual e estética que essa peça apresenta é impressionante. Não à toa caiu nas graças de artistas como Grace Jones e Toyah Wilcox, que a vestiram diversas vezes, inclusive até hoje Toyah surge em apresentações com versões de outros designers.


Assim como Issey Miyake, plástico também foi o material usado em um dos figurinos de Barbarella, filme protagonizado por Jane Fonda. O modelo remete à Lorica segmentata, um dos tipos de armaduras dos Legendários romanos no século 1. O longa é de 1968, portanto anterior aos modelos de YSL, e foi desenhado pelo figurinista francês Jacques Fonteray.


Depois de Miyake houve uma profusão de criações de bustos, alguns de plásticos e outros ampliando as diversificações de materiais. Os que mais trouxeram o modelo nas passarelas foram Thierry Mugler e Alexander McQueen. 

Cara Delevingne para GQ Men.
Mugler Verão 1991

Os bustos de prata de Mugler transmitem a forma feminina remetida num corpo robótico. Em 1929, é visto no filme 'Metrópolis' um robô que exibia essa mesma imagem. Anos depois no figurino de "O Guarda-Costas' de 1992, Whitney Houston usa um busto parecido com o de Mugler. Atualmente o designer Xtian de Medici cria seus modelos de luxo cheios de cristais Swarovski feitos de acrílico cromado para coleção 'Paradise' de 2018.


Alexander McQueen deve ter sido o estilista mais fascinado, pois em quase todo o desfile via-se algum estilo dessa peça. Inclusive ele levaria o busto nas suas criações quando fez parte da Givenchy, na qual Gisele desfilou o modelo de couro vermelho abaixo. Certas peças ficaram tão conhecidas que acabaram fazendo parte da exposição em sua homenagem, "Savage Beauty". Lee também fez parceria com o designer de joias Shaune Leane e juntos criaram peças esculturais fazendo com que nem todos os modelos sejam considerados roupa e sim joias, igual Lalanne e YSL.

McQueen Verão 1996. O busto de plástico transparente possuía minhocas vivas dentro.
McQueen Verão 1997
Givenchy Inverno 1999
McQueen Inverno 1999 e Verão 2005. Os modelos lembram a prótese de coluna de Frida Kahlo (meio).
Colaboração com Shaune Leane.
McQueen Inverno 1999
McQueen Inverno 1999 e Inverno 2009
McQueen Verão 1997

Assim como McQueen, o premiado estilista turco-cipriano Hussein Chalayan também fez peças que se associam com o busto moldado. Em sua coleção "Ventrilogy" de 2001, apresentou modelos de resina de poliéster e de açúcar, este, quebrado com um martelo ao fim do desfile. Um ano antes, havia apresentado uma peça escultural que entrou pra história da moda, criado para a coleção "Remote Control", popularmente conhecido como 'vestido-avião'. Segundo o MET, o estilista quis representar a relação entre natureza, cultura e tecnologia. Outra peça do estilista foi o bustiê em madeira da coleção "Along False Equator" de 1995, o Metropolitam Museum sugere que o bustiê lembra "próteses médicas antigas, a elegância dos cascos dos barcos e o confinamento de caixões".


No desfile Outono Inverno 1995, Vivienne Westwood fez um vestido inspirado na Rainha de Sabá para coleção "Vive La Cocotte", o torso é marcado com o contorno feminino sobre um espartilho com contas de vidro. A peça esteve numa exposição de 2004 sobre a estilista no Museu Victoria e Albert. Um detalhe é que esta exibição destacava a pesquisa da inglesa sobre história da moda e como esta influenciava seu trabalho.


Certas criações tiveram como intuito potencializar a sensualidade ou até mesmo o erótico do corpo da mulher. Isso fez com que marcas alternativas voltadas ao fetiche também fossem influenciadas por esta forma. Repare que a parte de cima do vestido de látex vermelho de Dita von Teese feita pela House of Harlot lembra muito o bustier de Issey Miyake. A seguir, Kate Moss no macacão de bronze feito pelo escultor Allen Jones. Abaixo,  modelos de Mugler e McQueen. 

Mugler Verão 2008, Verão 1991 e McQueen Inverno 2002.

E claro, as criações do espanhol Cecilio Castrillo Martinez, que mistura o universo de fetiche, dark e terror com armaduras. Assim como McQueen, o designer é fascinado pela peça que sempre aparece nas suas coleções. Confeccionados em couro, tem até modelo para grávida.


Parece que o retorno do bustier moldado pode vir com força. Na coleção de despedida de Jean Paul Gaultier, aparecem diferentes criações, entre elas busto e barriga, remetendo a YSL em 1969, e o torso masculino, remetendo ao peitoral militar greco-romano, que já fora apresentado antes nas passarelas por Alexander McQueen.


Esse em específico tem os seios em formato de Bullet Bra, modelo que possui uma trajetória na carreira de JPG e que já contamos a sua história aqui no blog! Tem também o post do Cone Bra e o fetiche.


E olha como são as coisas: o modelo de Jean Paul Gaultier nos remete a outra criação de 1928, um figurino utilizado pela atriz Marion Martin inspirado em 'Aelita, A Rainha de Marte'.


Além de passear por parte da história do bustier moldado em forma de torso feminino, um dos intuitos desse post é que, quem sabe, as marcas de moda alternativa brasileiras façam as suas versões, pois esta é uma peça lindíssima, que exalta justamente uma das partes do corpo da mulher que traz tanta polêmica quando desnudados: os seios e os mamilos. Pode-se ver que não há necessidade de fazer formas padronizadas, é possível abrir a mente e criar a diversidade de curvas existentes. Quando fizemos os posts sobre o bullet bra (sutiã cônico), não havia nenhuma marca daqui fabricando o modelo. Logo depois, várias produziram inspiradas pelo post! Fica então o desafio para vocês, designers, criarem essa peça incrível às nossas superpoderosas mulheres.

ATUALIZAÇÃO 19/03/2020 - TEMOS BUSTO BRASILEIRO!

Alguns dias após esta publicação ir ao ar, a Isabela Itabayana (@trashqueen13) de Belo Horizonte, entrou em contato através do Instagram do blog pra dizer que ela criou um busto em sua coleção de TCC chamada Agnatha, nome de um tipo de peixe sem mandíbula, uma das primeiras criaturas na evolução. A peça também homenageia os bustos da moda, como os de Issey Miyake e Thierry  Mugler. Para a estilista a peça é relacionada com sangue se ligando com a questão a vida/morte; ao aquário (reservatório de água, aqui preenchido com sangue) e ao sensual, ao "fetiche da imobilidade causada pela peça sólida, ereta, imóvel (como aquelas ilustrações da Bizarre)", diz ela.
A peça foi feita à vácuo, Isabela também desenhou e produziu todos os itens da coleção (os óculos, os sapatos...). A estilista também trabalha criando peças em látex que estuda desde 2015 e complementam o busto e os looks na passarela. Não posso deixar de registrar minha admiração pelo trabalho dela e espero que logo a tenhamos como uma nova marca no mercado nacional!
Existem muitos bustos no exterior, chegou a ser até exaustivo fazer a curadoria de fotos para essa postagem tamanho o volume de produções lá fora, que maravilha é poder mostrar agora ao Brasil (e aos leitores do resto do mundo), que também temos uma versão nacional! E mais admirável ainda: vindo de uma marca alternativa e não de grandes nomes da moda!
Agradeço muito a Isabela pelo envio de um texto explicativo sobre seu trabalho e as fotos com as etapas da construção da peça. <3

O busto.

O processo de criação.

Esquerda e centro: fotos do desfile. À direita, a estilista Isabela/@trashqueen13.
   

Direitos autorais:
Artigo original do blog Moda de Subculturas, escrito por Sana Mendonça e Lauren Scheffel. 
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21 de novembro de 2019

Juventude, Subculturas e Feminismo: Conheça a história do Sapato Boneca (Mary Jane shoes)

O modelo de sapato conhecido como "boneca", também chamado de Mary Jane, é um clássico da moda! Cheio de história, o calçado está nos pés tanto de crianças quanto de mulheres adultas e já ganhou as mais diversas versões: desde o modelo icônico criado pela estilista Vivienne Westwood até modelos que remetem à inspiração fetichista em salto agulha. Hoje vocês vão conhecer um pouco mais sobre esse calçado que nunca saiu de cena na moda alternativa!


Modelo clássico em verniz da loja Reversa


O começo

O sapato boneca surge como um calçado unissex, especialmente feito para crianças. Vocês já devem ter visto a cena em que  John Kennedy Jr. bate continência no funeral de seu pai, o ex-presidente americano  John Kennedy,  em 1963. O garotinho vestia este modelo de calçado. Assim como a famosa atriz mirim de Hollywood, Shirley Temple, usou-os de 1935 a 38.


Shirley Temple usando sapato boneca.

O motivo das crianças serem vestidas com o modelo é fundamentalmente por conta de uma tira que passa por cima do peito do pé, que impede o calçado de cair dos pézinhos que aprendem a andar ou correm por aí. 

Conhecemos por "sapato boneca" aqui no Brasil, justamente pelas bonecas (normalmente de feições infantis) serem vestidas com este modelo. Já o hábito de chamá-los de "Mary Jane" surge apenas em 1902 vindo de uma personagem da tirinha Buster Brown, desenhada por Richard Outcault publicada no Herald em Nova Iorque até o ano de 1906. A tirinha foi de extremo sucesso nos EUA, tanto que foi capitalizado e modelos do calçado foram vendidos associados aos personagens. Esse nome americano também é popular aqui no Brasil. 


Tirinha Buster Brown onde o garotinho e a garotinha vestem "Mary Janes"

Características

Sua marca primordial é ser um sapato preto de verniz, mas o que de fato define o modelo é a presilha por cima dos pés, que pode ser abotoada, com velcro ou fivelas; saltos (originalmente) baixos e bico fechado e arredondado.

 Reversa, uma das principais lojas alternativas brasileiras, já lançou diversos modelos de sapato boneca, seja no modelo clássico, seja em variações:


Da juventude ao "feminismo"

Na década de 1920, o modelo passa a ser muito usado pelas mulheres, especialmente as jovens. Quem lembra do post sobre as Melindrosas? Mas é só a partir da década de 1930 que aos poucos a ideia de que era um calçado apenas feminino começa a se difundir.



O calçado também parece estar muito associado à emancipação feminina e ao feminismo (liberal), observa-se que todas as épocas que as mulheres tomaram as rédeas de sua posição política na sociedade, o sapato ascende como moda. Um exemplo bem forte disso é que na década de 1960, o período do terremoto juvenil na Inglaterra, o calçado reaparece nos pés das garotas... 




... e da famosa modelo Twiggy - ícone da década - e em lojas como a Biba (clica aqui pra ler nosso post sobre a loja!). O estilista Courreéges, considerado criador da minissaia, peça revolucionária, também utiliza o modelo em sua marca. 




Vocês também devem lembrar de ver este modelo de sapato sendo usado com meias brancas até os joelhos, ou meias estampadas em imagens dos anos 1970. 



Na década de 1990, permanece associado à juventude e rebeldia quando os vemos nos pés das meninas grunges como Courtney Love e Kat Bjelland, mais especificamente no estilo Kinderwhore, visual que exatamente fazia  a mistura de infância e vida adulta. 





Naquela mesma década o calçado virou moda, e é possível vê-lo em diversas atrizes de cinema. 
Curiosidade: leia nosso post "Por que os anos 90 estão tão em voga".





Não é novidade dizer que há décadas o calçado está presente na moda das mais diversas subculturas (abaixo, sapato boneca na moda lolita) e tem ganhado novo fôlego de uns cinco anos para cá. Definitivamente o sapato boneca não parece sair de cena tão cedo!




Nas subculturas o calçado ganha traços mais exagerados, como a adição de plataforma e salto Anabela ou saltos grossos. Assim como adornos dos mais diversos tipos, como pingentes. 




Recentemente postamos sobre o retorno do solado conhecido no Brasil como "pata de bode", vários daqueles sapatos tinham o modelo boneca. Clica aqui pra ler a postagem.




Isso nos leva de novo à seu simbolismo feminista liberal, já que alguns consideram que estamos vivendo a quarta onda do feminismo e curiosamente, o sapato boneca voltou à moda há alguns anos.




E vocês, o que acham do calçado? 
Gostam do sapato boneca/Mary Jane?





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