Este post finaliza a análise sobre Subculturas e Individualismo. A primeira e segunda partes vocês podem ler clicando nos links abaixo:
O revivalismo nostálgico
Existem mais góticos atualmente do que na década de 1980.
Hoje, um jovem de 20 anos pode saber tanto sobre subcultura gótica como se tivesse vivido em 1983. E como ele consegue? Com a ajuda da tecnologia.
Chegamos agora na análise sobre a geração Y, geração jovem atual que nasceu cercada de mídia e tecnologia num mundo pós moderno.
Além de conhecerem as subculturas através da mídia e
da internet, já as receberam (ideologia e estética) pulverizadas da
Geração X - que podem ser seus tios, pais ou irmãos mais velhos. As informações sobre subculturas nunca estiveram tão acessíveis quanto agora.
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uma versão atual do pós punk |
Hoje, na pós modernidade focada no ciclo de produção e consumo, os gostos dos jovens mudam tão rápido que eles não ficam num estilo de moda por muito tempo. É uma geração que não quer ser rotulada nem categorizada, porque o passado e o futuro são tão fluidos que o que importa é o "agora".
Fazer parte de um grupo não é importante porque eles se sentem presos, já que nasceram numa sociedade onde nada é fixo e tudo é mutável. Enquanto que para a geração Baby Boomer e para a X, as subculturas eram um meio de encontrar semelhantes, dividir opiniões em comum e mostrar para a sociedade através das roupas que eram diferentes, a geração Y não faz tanta questão de se descolar da sociedade, pois o sistema individualista serve à eles em tudo que eles necessitam em termos de consumo e bem estar. Eles releem a moda das subculturas de uma forma revivalista e nostálgica, mantendo distância das ideologias.
Fernanda Lira, da banda Nervosa, num exemplo do retrô no Heavy Metal: ela usa um look que é releitura do que headbangers usavam na década de 1980.
Blade Runner, um filme pós-moderno parece ter tudo a ver com o "revivalismo nostálgico". Na obra, lançada em 1982, apenas 3 anos após "o fim" dos primeiros punks (com a morte de Sid Vicious), o futuro foi retratado em modas do passado. Replicantes e humanos vestiam trajes que lembravam tanto a glamourosa década de 1930 quanto os punks de 1970. Pessoas diferentes dividem o mesmo espaço, não dá pra saber quem é humano e quem é replicante. As aparências enganam, assim como hoje, não sabemos quem é alternativo e quem é fashionista ao fazer uma observação superficial de seus looks.
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Personagem Pris, Blade Runner: referência punk num filme ícone do pós modernismo |
As tendências alternativas da geração Y nascem e se proliferam no meio virtual. Os visuais atuais não são controversos, ao contrário, são bem "redondinhos". Se anos atrás Londres e Tóquio ditavam moda, hoje é o meio virtual. O Pastel Goth, o Seapunk, a trend Witchy, a boho, o Strega e a trend ocultista não nasceram num lugar físico, mas no virtual. Assim como a recente onda de meninas com cabelo escuro, franjinha pin-up, fãs de Mortícia, Vampira, fetichismo e de filmes de terror antigos. Esse tipo de comportamento é compreendido pelo modo que vivemos hoje, onde a imagem impactante é uma moeda valorizada. Assim, criar para si uma imagem rebelde, diferente ou absolutamente cool adquirida por pesquisas na internet e não mais por convivência ou troca de informações com outras pessoas, se torna o símbolo dessa geração tecnológica.
Jovens que não são parte de uma
subcultura, mas reproduzem estéticas subculturais variadas, esforçando-se para
desfazer estereótipos da mídia em visuais que são sombras do
passado, é um fato bocado complexo, por vezes contraditório e ao mesmo tempo fascinante de estudar.
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"Releitura" Deathrock |
E isso parece confundir alguns jovens também, "Não me identifico com nenhuma subcultura, tem algo errado comigo?"
A minha resposta seria: você é um jovem pós moderno que não viveu a era das subculturas em sua forma mais "pura" e portanto elas não fazem tanto sentido pra você, já que nosso contexto histórico atual é diferente de 30 anos atrás. Você também pegou a moda das subculturas já pasteurizadas pelo sistema. Amenizadas e massificadas. Você não precisa de um grupo ou de fazer amizade com pessoas pra adquirir conhecimento sobre um estilo, você sozinha em casa, pesquisa tudo no seu computador. Não precisa fazer DIY em suas roupas, você encontrará em lojas de departamento boa parte do que precisa. Ou quem sabe, importará da China. De alguma forma, aprendeu que é "normal" ver uma peça punk à venda na Renner. Ou peça fetichista na Zara. Para a geração baby boomer isso seria inconcebível. E para a geração X, "estranho". Para a geração Y, além de normal, é banal e aceitável, para alguns até desejável que mais e mais peças alternativas estejam em lojas mainstream. Essa mudança de mentalidade do jovem, ilustra bem como nosso conceito de individualismo atual é mais focado no consumo e na importância de formar uma autenticidade a qualquer preço.
Alguns antropólogos* estudiosos de culturas juvenis, chamam esse ato de mudar de estética várias vezes de "promiscuidade subcultural e estilística". Punks num dia, hippies no outro, góticos no seguinte. Estilos contraditórios que vão de cyberpunk à pin-up na mesma semana. Não à toa, pastel goths e até mesmo os hipsters já estão desaparecendo. É hora de migrar pra outro estilo ainda não popularizado.
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Geração Y: mistura de estilos |
Sombras dos estilos das subculturas do passado são vistas hoje nas ruas,
mas o que foi criado como nova estética alternativa?
Nossos pais e até avós estão vivendo mais, prolongando suas "juventudes". É comum que pais e filhos tenham o mesmo gosto musical. Então, por que os jovens atuais sentiriam necessidade de se rebelar se o sistema serve à eles? Se não há conflito com seus pais, se podem estudar, ter acesso ao que querem com o poder do consumo; se num celular eles conseguem se manter ocupados (lembrem que no passado era comum os jovens não terem o que fazer e sofriam de tédio)?
As subculturas então, viraram herança cultural, afinal, que tipo de rebeldia pode um adolescente ter hoje se seus pais foram punks?
Por que alguém optaria por adentrar num grupo?
Ser parte de uma tribo é uma das origens da natureza humana, assim evoluímos, os mais fortes sobrevivendo. Como nossos ancestrais, ser parte de um grupo, trás a sensação de pertencimento.
Enquanto a maioria dos adeptos de uma determinada subcultura se conhecem e interagem, a geração Y e seu estilo mutante é unida pela mídia, música, internet e referências imagéticas de estilo, interagir fisicamente entre si não é o foco.
Comparação interessante entre tribo primitiva e a "tribo" punk.
Em comum: a convivência em grupo.
Quando você tem uma sociedade ultra individualista, submissão não é algo facilmente aceitável, por isso existe a negação de rótulos, categorias e classificações. As pessoas não querem ser colocadas em "caixas".
E talvez, com o extremo individualismo da pós modernidade, por não interagir tanto mais com as pessoas, não aprender com outras pessoas (aprender sozinhos via web) estejamos carentes de pertencimento e por isso estejamos ficando infelizes e com uma sensação de solidão?
Curiosamente, uma das tendências atuais é o consumo compartilhado. Estilistas têm falado em seus desfiles sobre ser parte de um grupo. Na Europa nunca teve tanta exposição sobre subculturas, como se, de repente, elas estivessem finalmente sendo reconhecidas por sua importância. Por que estas pessoas importantes, museus e galerias estão voltando seus interesses às subculturas? Será que perceberam que elas têm muito mais a nos ensinar?
Jordan em '77.
E esse brinco de cruz invertida, super trendy hoje, né?
Política se trata de coletivo
Precisamos do grupo para podermos mudar as coisas que nos incomodam na sociedade. Quando se trata de política, é importante lembrar que muitas vezes temos que passar por cima das nossas opiniões pessoais, porque mudança social não envolve uma pessoa só, envolve o coletivo. Viver em sociedade significa cada um fazer sua parte para o bem comum e isso às vezes significa perda de privilégios em troca de ganho social (comum em países com mais qualidade de vida).
Será que no fundo todos queremos união na cena alternativa mas não sabemos como "neutralizar" nossa individualidade em prol do bem comum? Como se tornar menos consumista numa sociedade em que tudo é comprável? Como manter a individualidade sem se tornar egocêntrico ou egoísta? Pessoas estão tomando um caminho narcisista sobre o individualismo, só dão atenção àqueles que os idolatram e que possuem algum interesse. Se você não tem nada a acrescentar - no sentido material ou de alimentar o ego e o status do narcisista, sua amizade não interessa à ele. Onde vamos parar com cada um no seu canto, reclamando da vida, esperando um like e ficando deprimido quando seu ego não é alimentado? O que estamos fazendo com o riquíssimo legado das subculturas sobre amizade e companheirismo?
No passado, a moda de rua e as subculturas uniam as pessoas que se sentiam diferentes.
Ainda dá tempo de nos vermos como seres ativos, que mesmo diferentes, unidos seremos capazes das mudanças sociais que queremos. A gente só precisa pensar se o sistema atual é o que desejamos pro resto de nossas vidas. Como o mundo virtual pode ser usado pra reunir as pessoas e não afastá-las e como podemos usar nossa individualidade de uma forma que não seja nociva.
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Punxs felizes (década de 80) |
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